Sítio do Piropo

B. Piropo

< Trilha Zero >
Volte de onde veio
29/12/2003

< O tempo, esse canalha... >


A primeira Coluna do Piropo chamou-se Trilha Zero. Foi publicada em março de 1991. Já lá se vão quase doze anos, uma eternidade em informática. Ela descrevia meus primeiros entreveros com o computador, os sofrimentos e agruras a que fui levado por mera ignorância e os alvitres usados para adquirir conhecimento. E oferecia aos leitores uma fonte para sorver algum deste conhecimento. Se você é saudosista, ainda pode encontrá-la em meu sítio, na seção “Escritos - Coluna do Piropo/Trilha Zero – 1991”. Acabei de lê-la e, confesso, bateu uma tristeza funda em meu coração. Uma tristeza à qual eu, sexagenário que sou, já deveria ter me acostumado: sentir de relance o gosto de um tempo bom que se foi.
Há uma década o computador era uma máquina misteriosa que precisava ser desvendada para ser usada. Havia que conhecer comandos arcanos, saber lidar com eles, digitá-los corretamente e, quando algo dava errado havia que saber interpretar as misteriosas mensagens de erro. Poucos se arriscavam a usá-lo. E eu procurava ajudá-los.
Hoje, o computador continua uma máquina misteriosa. Mas para usá-lo basta mover um mouse sobre uma superfície plana e apertar um par de botões. Os erros continuam ocorrendo, mas a atitude do usuário mudou. Os do século passado preocupavam-se em conhecer suas causas para eliminá-los e seguir adiante com a satisfação de haver resolvido o problema. Os deste século se preocupam apenas em ter o problema resolvido, de preferência sem sua intervenção. Já não querem mais ajuda.
Os usos também mudaram. Os micros transformaram-se em dispositivos de comunicação e isso alterou completamente o universo micreiro. É claro que a transformação foi para melhor. Antes, para escrever sobre uma nova tecnologia, eu teria que me munir de uma pilha de livros para estudar seus fundamentos e outra pilha de revistas técnicas e “press-releases” atualizados para abordar os detalhes novos. Gastava dias de trabalho insano e sempre acabava faltando algo. Hoje, para fazer a mesma coisa, com uma conexão de Internet rápida e o Google, bastam algumas horas para produzir um texto com um nível de detalhes e atualização infinitamente maior. Um pouco de prática no uso da Internet, algum conhecimento e um mínimo de habilidade para manejar as ferramentas de busca facilitaram extraordinariamente a labuta no ofício de informar.
Mas a Internet trouxe também os blogs, fotologs e outros logs. Eu, que pouco me interesso pela vida alheia e não faço o menor gosto em divulgar a minha, jamais os freqüentei. Não vejam nisso nenhum desprezo pelos que os produzem ou os freqüentam. Respeito seu gosto e louvo seu trabalho para manter o universo informado sobre os importantes detalhes de suas vidas diárias. Mas ainda sou daqueles que preferem usar a rede para obter informações factuais. E fornecê-las, claro. Por isso, em vez de um blog, mantenho há anos o “Sítio do Piropo” em <www.bpiropo.com.br> cuja única finalidade é divulgar informações técnicas sobre micros, dicas sobre uso de programas e coisas que tais. Coisas úteis para aqueles que não se satisfazem em saber que o problema foi resolvido mas fazem questão de saber como resolvê-lo. Felizmente, ainda há um bocado de gente assim.
Há alguns anos, em uma palestra sobre tecnologia (sim, uma das minhas atividades preferidas é ministrar palestras), um jovem me perguntou pelo futuro do microcomputador. Bem, respondi eu, essa é fácil: em breve desaparecerá. O jovem estranhou, indagando: não haverá mais microcomputadores? Mas claro que haverá, respondi. Eles desaparecerão não por cessarem de existir, mas por cessarem de serem vistos. Estarão em tantos lugares que passarão despercebidos: nos telefones, nos fornos de micro-ondas, nas agendas de mão, nos óculos, nos brinquedos, nas TVs, nas jóias, até mesmo em nossas roupas. Serão tão ubíquos, de tal forma onipresentes, que mal repararemos neles.
Quando desaparecerem, ninguém mais se preocupará em saber como funcionam. Como estas esferográficas baratas (por que aquela tinta não vaza?), quando pararem de funcionar, descarta-se e compra-se outra. Em breve faremos o mesmo com os computadores (na verdade, já o fazemos: esses cartões de Natal “musicais” contém um microprocessador, ou seja, o cerne de um computador, e são descartáveis).
Em suma: computadores são uma espécie em extinção. E quando se extinguirem, não haverá mais necessidade – por absoluta falta de interesse – de uma coluna como esta. Então, extinguir-me-ei também.
Ao fim e ao cabo, para usar os termos da moda sou, “tipo assim”, um dinossauro...
Feliz 2004.

B. Piropo