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04/03/1991
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< A Trilha Zero N° 1 >
Meu primeiro micro tinha um BASIC permanente. Cavalgando essa maravilha da moderna tecnologia, armado com seus singelos oito bits e com o cego entusiasmo dos inocentes, comecei a desbravar a tenebrosa selva da informática a destemidos golpes de BASIC. Mantinha com a máquina uma relação amistosa, porém carregada do respeito místico que o desconhecimento impõe. Intimidades, nem pensar. Qualquer tentativa mais ambiciosa era imediatamente fustigada com mensagens ameaçadoras, prenhes de significados ocultos. O primeiro confronto com "Abort, Retry, Ignore" me obrigou a decidir entre três opções terrivelmente drásticas. O primeiro "Fatal error" me fez sentir um homicida. A cada "Bad command or filename" me sentia como o garotinho repreendido pela professora sem nem saber ao certo que erro tinha cometido... Mas fomos seguindo adiante, eu e minha máquina. Experiências inesquecíveis foram vividas. Muitas, gratificantes. Algumas, traumáticas. Certa noite, às onze, após digitar um programa em BASIC desde as seis da tarde, decidi-me a gravar no disquete o fruto de minha engenhosidade. Precavido, como convém a um bom micreiro, achei de bom alvitre verificar antes se havia espaço em disco para aquela preciosidade que me custara cinco horas de trabalho. Chamei o sistema operacional e digitei "DIR". Maravilha: o sistema operacional, com sua milagrosa sapiência prontamente abriu as entranhas do disco e desnudou impudente suas intimidades, seus arquivos, datas de criação, espaço ocupado por todos eles, e, helás, a preciosa informação procurada. Sim, havia bytes livres suficientes para preservar para as futuras gerações o fruto de minha criatividade. Ainda impressionado com a precisão da máquina e orgulhoso pelo feito de ter extraído dela exatamente a informação necessária, voltei ao BASIC para salvar o programa. Mas me faltava ainda a ousadia dos destemidos que subjugam a máquina a seus desejos. Meus passos eram hesitantes como sempre são os de quem desbrava o desconhecido. Verificar cada ítem era meu procedimento padrão naqueles dias. Antes de gravar, melhor fazer a revisão final do programa. Cinco horas de trabalho árduo não se desperdiçam gravando um programa capenga. E, convicto, bravamente digitei "list". A máquina exibiu um irônico "OK" e um cursor que piscava para mim com um jeito safado. Mas como OK ? Que OK ? E meu programa ? ONDE ESTAVA MEU PROGRAMA ? Então essa máquina maldita engole minhas cinco horas de digitação e tudo que sabe me dizer é que está OK ? Decididamente, qualquer coisa, menos OK. Foi assim que aprendi que a memória RAM é mais efêmera que paixão de adolescente. E, acreditem, descobrir uma coisa me doeu tanto quanto descobrir a outra... Se você não se solidarizou com minha dor por desconhecer o que é "basic permanente" ou "chamar o sistema operacional", não se preocupe. Logo logo você vai saber, aqui mesmo. Mas seja qual for seu nível de intimidade com a máquina, garanto que você ainda encara suas vicissitudes. Na verdade todos nós enfrentamos eventualmente a necessidade de sopitar aquela imperiosa compulsão de defenestrar - literalmente - o nosso micro. A frequência com que isso ocorre é que tende a diminuir com o tempo. O caminho do micreiro é pavimentado de alegrias e decepções. O prazer de ver rodar nosso primeiro programa que faz alguma coisa além de dar alô para o mundo em inglês jamais vai ser superado pelo desespero de ter apagado todo um disco rígido com um inadvertido "format c:". Ambas as coisas já ocorreram, ocorrem e ocorrerão ainda na nossa intimorata exploração das pradarias virgens da informática, independentemente do nosso grau de conhecimento. Mas nada impede que a gente procure aumentar nossa quota de prazer e diminuir a contrapartida de sofrimento. Assim é a vida - e não só a do micreiro. Muita coisa se aprende perguntando àquele amigo esperto que manuseia a máquina com o ar entediado de quem amassa uma carteira de cigarros vazia. Algumas dificuldades são superadas consultando os parcos livros de boa qualidade sobre o assunto. E, em último recurso, sempre resta apelar para o velho aforisma: quando tudo o mais falhar, consulte o manual de operação. Mas tem coisa que o amigo não sabe (embora nem sempre seja capaz de admitir), que aquele livro do sorridente rapaz de camisa cor de rosa se esqueceu de abordar ou que o manual de operações descreve com uma linguagem mais cifrada que entrevista do economista de plantão. E aí ? Bem, aí entramos nós. A partir de hoje, estaremos aqui para isso. Vamos procurar desvendar a máquina, seu sistema operacional e seus mistérios da forma mais simples e menos enigmática possível. Nosso alvo é o micreiro desamparado que passa a noite de domingo tentando fazer rodar aquele maldito programa que fazia maravilhas de cavaleiro andante na máquina lá do escritório e que empaca irredutivelmente no seu doméstico XT, até descobrir as mágicas virtudes do seu fiel escudeiro, o programa de configuração. E isso, enfrentando um "e então, você não vem dormir, MEU BEM!" a cada cinco minutos da última meia hora... Nosso objetivo é lhe poupar algumas experiências dolorosas transferindo para você um pouco do conhecimento adquirido em anos de sofridos embates com a máquina e seus programas. E vamos procurar fazer isso sem a chatice estruturada de um "curso para principiantes". Será através, principalmente, de respostas às suas perguntas. Pergunte. Sem receio. Nenhuma pergunta é estúpida - embora, eventualmente, você possa considerar que minha resposta venha a ser. Vamos tentar manter a coisa em um nível que não exija mestrado em informática para acompanhar, seguindo o sistema preconizado pelo meu amigo Benedito Gerbase e que ele chama de KISS: Keep It Simple, Stupid (E esse stupid, evidentemente, se aplica não a quem pergunta, mas a quem costuma responder coisas simples com explicações crípticas). Pergunte qualquer coisa, que nós vamos tentar responder. Evidentemente, você pode perguntar coisas do tipo "Porquê o serviço 00h da interrupção 16h da BIOS não reconhece as teclas do teclado estendido ?", e nós poderemos até responder. Mas não aqui. Esse espaço vai ser dedicado a coisas mais frugais e corriqueiras, vai procurar mitigar as comezinhas aflições do dia a dia do micreiro desamparado que está tentando domar uma CPU rebelde com pertinácia e entusiasmo. Vai ser principalmente para esclarecer coisas como o que vem a ser um programa residente, o que é, para que serve e como funciona o famoso sistema operacional, para que servem o Autoexec.Bat e Config.Sys e coisas que tais. Singelas, porém importantes e tão freqüentemente incompreendidas... Mas se você chegou até aqui para dar aquele grunhido entediado do expert que do alto de sua inexcedível sapiência se deparou com "mais uma coluna para principiantes", contenha-se. Mesmo assim, dê uma espiada nesse canto de vez em quando. É surpreendente a facilidade com que a gente se esquece das coisas triviais. Nesses últimos tempos de convívio agradável - embora eventualmente conflituoso - com os micros, aprendi muito. Do meu BASIC titubeante evoluí para um assembly razoavelmente fluente e passei recentemente para o C++, a flamejante linguagem da moda com seus reluzentes objetos e suas mágicas funções virtuais. Transitei dolorosamente da placa controladora encharcada do suor de minha testa em minhas mãos trêmulas ao instalar meu primeiro drive em seis horas para a montagem de um 386 em quinze minutos. Aprendi às custas de alguns milhares de páginas de livros técnicos, manuais, arquivos Read.Me e, sobretudo, do penoso método do ensaio e erro, os mistérios da arquitetura interna dos PCs e as manhas de seus programas. E continuo aprendendo. Sem jamais deixar de ler as "colunas para principiantes". Pois, quanto mais aumenta o meu conhecimento, mais me assombra o tamanho de minha ignorância... B. Piropo |