Escritos
B. Piropo
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12/07/1999

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Começamos hoje uma série de colunas sobre o bug do ano 2000. O assunto tem aspectos fascinantes e quanto mais nele me aprofundo mais descubro novidades instigantes. Nem todas, evidentemente, ligadas à informática. Há coisas interessantíssimas que dizem respeito, por exemplo, a peculiaridades do nosso calendário.

Para ser completa, uma verificação de adeqüação ao ano 2000 deve testar o dispositivo para os dias 29/02/2000 e 01/03/2000, pois o ano 2000 é bissexto. O que parece natural, já que a cada quatro anos há um ano bissexto e 1996 foi bissexto. Daí pode derivar-se a regra simplista de que todo ano divisível por quatro é bissexto e, portanto, 2000 o será. Mas ela não seria verdadeira, já que os anos 1700, 1800 e 1900 foram divisíveis por quatro, porém não bissextos. Então, derivemos uma nova regra: todo ano divisível por quatro é bissexto, desde que não seja divisível por cem – o que faria com que 2000 não fosse bissexto. Essa também seria errada. A regra verdadeira é: todo ano é bissexto se for divisível por quatro, desde que não seja divisível por cem, exceto se for divisível por 400 (portanto 2000 será efetivamente bissexto, assim como foi 1600 e serão 2400, 2800, etc.). Bem, isso não chega a ser propriamente fascinante, é só uma curiosidade. Como em tudo mais na vida, fascinantes as coisas se tornam quando começamos a investigar o porquê delas serem como são. Por que a regra é tão esdrúxula? Qual a razão de existirem anos bissextos? Afinal, o que é realmente "um ano"? E "um dia"? Exatamente quanto tempo duram?

Estamos acostumados com a idéia de que um ano é o tempo gasto pela Terra para dar uma volta completa em torno do Sol e um dia é o tempo gasto para dar um giro completo em torno de seu eixo. E de fato assim é. Mas quanto duram estas voltas? Um dia, sabemos todos, dura exatamente 24 horas. E um ano? Bem, respondendo sem refletir, a maioria de nós dirá que um ano dura 365 dias. Depois, pensando melhor, nos lembraremos dos bissextos e diremos que na maioria das vezes o ano dura 365 dias mas que eventualmente pode durar 366. Mas o que quer dizer isso exatamente? Que a cada quatro anos a Terra se desloca um pouco mais lentamente e sua volta em torno do Sol é mais demorada? Evidentemente que não.

A discrepância existe porque os movimentos da Terra em torno do Sol e de si mesma não são sincronizados. E por que seriam? Afinal, não há nada que obrigue a terra a girar exatamente 365 vezes em torno de si mesma enquanto completa uma volta em torno do Sol. Se começarmos a observar a posição da terra em relação ao sol em um dado momento, descobriremos que até retornar àquele ponto depois de uma volta completa ela girou exatamente 365,2425 vezes em torno de si mesma. O que significa que um ano dura um pouco mais que 365 dias. Dura exatamente 365 dias, cinco horas, 49 minutos e 12 segundos. Pouco menos que 365 dias e um quarto. Como "sobra" cerca de um quarto de dia em cada ano, a cada quatro anos é preciso acrescentar um dia ao ano. Por isso os anos bissextos.

A complexidade da regra da criação de bissextos deriva do fato de não serem exatamente 365 dias e 1/4, mas quase isto. Se exprimirmos a fração decimal 365,2425 como fração ordinária, obteremos 365 dias e 97/400 (trezentos e sessenta e cinco dias e noventa e sete quatrocentos-avos). Basta pensar um pouco para concluir que a solução do problema é criar 97 bissextos a cada 400 anos. Ora, se criássemos um bissexto a cada quatro anos, teríamos 100 bissextos em cada 400. Para ter 97, basta "tirar" três. A escolha recaiu sobre os que são divisíveis por cem. Mas destes há quatro em cada 400. Então, excluiu-se o que é divisível por 400. E aquela regra aparentemente cabalística se torna clara com água. É ou não fascinante? (se você deseja saber mais sobre o assunto, recomendo o documento "Frequently asked questions about calendars", encontrado em [http://www.pip.dknet.dk/~c-t/calendar.html]).

Os que não gostaram desta coluna porque ela teve pouco a ver com informática, me desculpem. Mas como eu disse, ultimamente ando obsedado pelo tema do ano 2000 e nem tudo na vida tem a ver com informática. Mas prometo que semana que vem começaremos a abordar o assunto de uma forma mais voltada para nossos computadores e para os efeitos do bug em nossa vida diária. Até lá.

Incidentalmente: entro de férias amanhã, dia 13. Mas continuarei aqui neste canto de página incomodando vocês. O que não prometo é manter o correio eletrônico em dia, atualizar as seções Dicas e Respostas de minha página pessoal em [http://www.bpiropo.com.br] e responder perguntas por e-mail. E nem se trata de má vontade: para onde pretendo ir, não somente estarei longe de minhas fontes de consulta como também espero pensar muito pouco em informática. Exceto, é claro, durante os dias em que freqüentarei uma feira sobre a qual lhes mandarei notícias. Que feira? Surpresa. E bota surpresa nisso...

B. Piropo