Escritos
B. Piropo
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10/08/1998

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Para que serve um micro? Para um zilhão de coisas, dirá você. De uma arcana geringonça cujos mistérios eram dominados por meia dúzia de cientistas e técnicos especializados, em menos de duas décadas o computador transformou-se em uma ferramenta integrada à vida diária de qualquer profissional liberal e de quase todo o mundo que trabalha em escritório. Portanto a imensa utilidade dos computadores é indiscutível. Mas será que "servir" significa apenas prestar-se à ser usado como ferramenta para executar um trabalho? Ou seu computador "serve" para algo mais?

Já há alguns anos leciono Arquitetura de Computadores na Faculdade da Cidade de Ipanema. A cada novo período, ao estabelecer contato com a turma, procuro sempre conhecer os alunos. O que os levou a fazer aquele curso? Por que informática? O que fazem com seus computadores?

Em princípio seria de esperar que a moçada estivesse ligada mesmo é na profissão. Mas o que tem realmente motivado o pessoal é mais o gosto pelo micro em si mesmo que o interesse pela carreira. Uma pesquisa superficial mostra que, ao fim e ao cabo, a eles interessa mais conhecer o funcionamento de suas máquinas que as possíveis maravilhas que algum dia poderão executar com elas. Ou seja: consideram o micro um fim, não um meio.

Isto, para mim, definitivamente não constitui surpresa. Pois não foi outro o meu caminho. Comprei meu primeiro micro porque, sendo engenheiro, constatei que se não adquirisse pelo menos os conhecimentos básicos sobre computadores, logo seria alijado da carreira pela concorrência (e, diga-se a bem da verdade, não creio que estivesse enganado). Mas ao tentar tirar algum proveito prático de minha nova aquisição, o desafio representado pela máquina rebelde absorveu-me de tal maneira que somente fui efetivamente aplicar algum conhecimento de informática em minhas atividades profissionais muitos anos depois, quando a curiosidade inicial foi saciada. Portanto, para mim, muito antes de ser um instrumento de trabalho, o micro foi (e, enquanto vocês me encontrarem aqui neste canto de página, continuará sendo) um objeto lúdico. A mesma fonte de prazer que o brinquedo representa para a criança.

Tudo isto vem a propósito de um programeto sobre o qual falei semana passada, o Presente de Gregg. Um produto brasileiro, desenvolvido pela Z-Movie Studio [http://www.zmovie.com.br] (que também desenvolveu o interessante "Caras e Bocas" do Daniel Azulay, voltado para o público infantil), editado e distribuído pela Paradigma Editora e que pode ser comprado por menos de quarenta reais diretamente da NetByte em [http://www.netbyte.com.br] (não, eu não ganho comissão, não conheço os autores nem os distribuidores e não tenho nada com isso; apenas gostei do programa, que conheci na Fenasoft). Um programa que, presumo, dificilmente será usado para fins profissionais. Mas que, definitivamente, "serve" para alguma coisa.

O cerne do produto é um módulo que, a partir de um conjunto de algumas dezenas de componentes postos à disposição do usuário, permite criar caricaturas na base do "arraste-e-solte". Os componentes são uma curiosa coleção de formatos de rosto e cabeça, olhos, narizes, sobrancelhas, orelhas, bocas e corpos, enfim, todo o necessário para montar uma caricatura, e mais um mundo de adereços como chapéus, penteados, barbas, bigodes e óculos que permitem até mesmo a alguém como eu, que desenho com a graça e leveza de um elefante dançando valsa, criar uma caricatura bastante razoável. E que, além disto, fornece um pequeno mas eficaz arsenal de ferramentas gráficas para traçar linhas e figuras geométricas cheias ou vazadas, colorir e acrescentar pequenos textos, uma delícia para quem tem dotes artísticos e pode com elas enriquecer bastante o desenho. Feita a caricatura, o programa permite imprimi-la em diversos formatos, inclusive em etiquetas adesivas ou papel transfer para decorar camisetas.

Até aí, nada demais. Há dezenas de programas semelhantes, que fazem mais que isto, alguns até melhores. O que tornou o Presente de Gregg um programa único foi a centelha de criatividade que levou seus autores a adicionar um módulo que permite ao usuário gravar de viva voz uma mensagem sonora e fundi-la à caricatura, cujos lábios e olhos se movem ao "tocar" a mensagem. E acrescentar alguns recursos simples que permitem distorcer a voz gravada, tornando-a mais grave ou aguda, acelerada ou lenta e com eco. E ainda, depois de tudo isto, gerar um arquivo executável que pode ser gravado em disco ou anexado a uma mensagem de correio eletrônico.

O resultado? Um programa que faculta até mesmo a um analfabeto gráfico como eu mandar de presente a um amigo (ou inimigo, dependendo da mensagem) um arquivo que, ao ser executado, transmite uma mensagem sonora declamada por uma caricatura animada de minha própria lavra. Coisa que, sem o Presente de Gregg, seria absolutamente impensável.

Um negócio destes é útil? Com certeza que não.

Mas, meu amigo, há muito tempo não me divirto tanto com meu micro...

B. Piropo