Escritos
B. Piropo
Anteriores:
< Trilha Zero >
Volte de onde veio
20/07/1998

< Vai dar na Internet >


Se tem coisa que eu estranho hoje em dia é receber uma carta, daquelas tradicionais, com arquivos anexados do jeito antigo, via disquete. Algo raro nestes tempos em que se faz de tudo pela Internet, inclusive atentar contra a castidade. Pois, se você ainda não sabe, os jornais estão anunciando que um jovem casal decidiu sacrificar a mútua virgindade diante de uma câmara de vídeo que transmitirá a, digamos, cerimônia, em tempo real via Internet. O que faz prever um notável congestionamento no dia e hora agendado para o ato (no sentido lato e no estrito). Se você é um dos que pretendem espiar a coitada (ôpa!) da dupla, sugiro em vez disto uma visita às estantes dos fundos de sua locadora de vídeo para alugar uma fita do tipo "garotas que fazem tudo". Agindo assim, não apenas colaborará para reduzir o congestionamento na já tão sacrificada infovia, que definitivamente não foi concebida para veicular concúbitos, como também, do ponto de vista do, digamos, espetáculo, será brindado com uma atuação significativamente mais requintada. Porque neste ramo de atividade, mais que em qualquer outro, a prática exerce soberana influência no desempenho.

Mas voltando ao que interessa: a carta vinha do Roberto Góes Monteiro. Que não conheço, mas já é um velho amigo. Pois o Roberto desenvolveu um programeto dos mais interessantes e úteis, o SRE, para criar cópias de segurança do Registro de Windows (se você não sabe o que o registro nem porque suas cópias de segurança são importantes, sugiro uma urgente leitura da série de colunas sobre o assunto publicada aqui mesmo de 31/03 a 16/06 do ano passado e que pode ser encontrada na seção Escritos/Anos Anteriores de minha página pessoal, em www.bpiropo.com.br).

Roberto é um médico oculista que vive em Belo Horizonte. É um jovem mais ou menos da minha idade cujo primeiro micro foi um valente 386 comprado nos idos de 94. É praticamente um autodidata em informática: aprendeu o básico com um tio e a partir daí seguiu sozinho, lendo e experimentando. Comprou o computador para organizar dados, textos e ilustrações de um trabalho que pretende publicar sobre seu hobby, colecionar canetas. Agregou a informática à sua relação de hobbies. Teve algumas experiências desastrosas com os utilitários da MS para criar cópias de segurança do Registro e decidiu desenvolver ele mesmo um programa para este fim.

O SRE é simples e eficaz. Mantém até seis cópias de segurança compactadas dos arquivos que formam o Registro e, de lambuja, dos arquivos de configuração do DOS e do próprio Windows (a partir da sexta cópia substitui as antigas pelas mais novas), permitindo restaurar qualquer uma delas a qualquer momento. Embora o Roberto não seja programador, o SRE parece coisa de profissional: vem com instalador e tudo. Instalei-o em minha máquina e achei-o tão interessante que abri uma exceção e, com a indispensável autorização do autor, coloquei-o à disposição do público: ele pode ser encontrado na seção Opinião de minha página pessoal. É freeware. Pode ser usado gratuitamente, sem registro nem pagamento. Para experimentar, basta transferi-lo para sua máquina e instalar - lembrando, porém, que eu nada mais fiz que colocá-lo à disposição. Se gostar, agradeça ao Roberto. Se não, entenda-se com ele.

Nisto tudo, o que mais me causou espécie não foi ter recebido um programa tão interessante desenvolvido por um médico. Afinal, o Tom's Hardware Guide, o melhor sítio de informações técnicas sobre computadores da Internet, é mantido pelo Tom Pabst, também médico. O que de fato me impressionou foi a forma pela qual o programa chegou às minhas mãos: gravado em disquete, pelo correio. Por que não pela Internet, deus meu? Sem alternativa, fui obrigado a recorrer ao mesmo meio arcaico para saciar minha curiosidade e escrevi para o Roberto perguntando as razões de tamanho despautério.

Respondeu ele: "Acho a web lenta confusa, imprevisível. Num dia tudo funciona, está rápida; noutro, nada funciona ou está lerdíssima. Acho a maioria das páginas muito confusas para o meu gosto. Surfar, jamais. Submeto-me aos caprichos da Web, mas não me sinto bem nela. Falta-me, creio, paciência. Talvez um dia eu mude. Ou ela".

Ora, Roberto, ou eu muito me engano, ou se ela mudar será para pior. Apesar disso, não dá mais para viver sem ela. Portanto, melhor mudar você. Pense bem: se você estivesse usando pelo menos o correio eletrônico, nossa troca de correspondência teria sido muito mais rápida e mais ágil. Hoje em dia, recusar-se a aderir é ficar para trás.

Então, Roberto, deixe disso e internete-se. Os tempos são outros. Veja lá: sem Internet, o máximo que você conseguiu foi uma menção nesta pobre Trilha Zero. Enquanto isso, a moça lá do primeiro parágrafo está ganhando espaço com direito a foto na primeira página dos jornais do mundo inteiro. Por que a diferença?

Ora, porque você, quando decidiu dar seu programa, fê-lo do jeito convencional, pelo correio. Enquanto ela aderiu à modernidade: avisou que vai dar na Internet.

B. Piropo