Escritos
B. Piropo
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24/02/1997

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Você pretende comprar uma placa controladora, um periférico ou um componente qualquer. E já que a internet abre as portas de lojas espalhadas por todo o mundo, imaginou que talvez comprar lá fora fosse mais proveitoso. É verdade: talvez você possa fazer um bom negócio. Mas não espere uma pechincha, pois após o pagamento dos impostos a coisa fica bem mais salgada do que parece à primeira vista. E isto se tudo correr bem. Pois se algo der errado, prepare-se para grandes aborrecimentos.

Em princípio, tudo é muito simples. Especialmente com a ajuda do Price Watch - Street Price Search Engine [http://www.pricewatch.com/], que fornece os preços correntes de virtualmente qualquer coisa que tenha a ver com informática, seja hardware ou software. Você pode pesquisar por marca, fabricante, categoria, o diabo: o resultado é um quadro com a marca, modelo, descrição e especificação do produto, assim como nomes e telefones das firmas onde ele pode ser encontrado e por que preço. Como a maioria delas mantém uma página na rede, uma pesquisa em um dispositivo de busca tipo Alta Vista o leva até lá. Depois, basta preencher o formulário de compra, entrar com o número de seu cartão de crédito (criptografado, é claro) e aguardar. Se tudo correr bem, em menos de uma semana você receberá sua encomenda e uma ficha de compensação para ressarcir a transportadora pelo pagamento das despesas feitas em seu nome. E todos serão felizes para sempre. Ou não.

Agora vamos discutir esse "ou não" aí de cima. Começando pela questão das despesas. Que inclui dois impostos: o de importação, correspondente a 60% do valor declarado da mercadoria (sem limite de isenção), e o ICMS, que monta a 18% do total. E aí começam os problemas. É prática nos EUA incluir o custo do transporte no valor declarado. É que lá o valor declarado serve para calcular o ressarcimento no caso de extravio, que deve cobrir os custos de novo transporte. Mas como a transportadora sabe que será ressarcida, nem se preocupa em verificar o real valor da mercadoria para o cálculo dos impostos (o que seria facílimo, já que obrigatoriamente a nota vem anexa) e simplesmente usa o valor declarado - afinal, por que brigar com a alfândega para pagar o realmente devido, se o dinheiro não é dela? O resultado é que isto pode onerar bastante a transação. Um exemplo: o transporte de uma placa-mãe de US$200 dos EUA ao Brasil custou US$61. Na ocasião, o dólar americano estava cotado a R$1,033. O remetente incluiu o custo do transporte e declarou o valor de US$261. O imposto de importação foi calculado convertendo-se este valor para Reais (R$ 269,56) e aplicando-se sobre ele a alíquota de 60%, o que resultou em R$161,74. Que foram somados ao valor declarado para servir de base ao cálculo dos 18% do ICMS, que chegou a R$77,63. Juntando o ICMS, o imposto de importação e as despesas de desembaraço alfandegário (R$10,38), o total elevou-se a R$249,75. Se levarmos em conta que no caso particular a mercadoria custou US$200, os impostos, taxas e despesas chegaram a 120%. Portanto, se você decidir a efetuar uma compra no exterior, insista junto ao remetente para que o valor declarado se restrinja ao custo da mercadoria, deixando o transporte de fora. Mas lembre-se que ainda assim os impostos e despesas de desembaraço ultrapassarão os 95% do valor da mercadoria.

Note que o cálculo e o pagamento dos impostos são feitos em seu nome, mas à sua revelia. Ou seja: um funcionário da transportadora (que nem ao menos pode se arvorar em seu representante, já que seus serviços não foram contratados por você, mas pelo remetente) calcula o imposto sobre um valor maior que o devido sem se dar ao trabalho de consultar a nota de venda, efetua o pagamento em seu nome sem lhe pedir autorização e depois lhe envia uma nota de débito. Alegam que isso é feito para agilizar o processo. É possível que de fato agilize. Mas seria o procedimento legal? Você deve mesmo aquele valor? Afinal, se o cálculo fosse submetido à sua apreciação, você sempre poderia discordar e solicitar que fosse utilizado o valor correto. E se continuasse discordando, poderia simplesmente se recusar a pagar (e não receber a mercadoria, evidentemente). Dependendo do preço da mercadoria, do custo do transporte e do imposto calculado, pode ser mais vantajoso simplesmente arcar com o prejuízo e desistir de receber a encomenda. E sendo ou não vantajoso, é seu direito. Um direito que lhe é subtraído na medida que tudo é feito à sua revelia.

Mas quem sabe não vale a pena? Afinal, pagar o dobro do preço e mais o custo do transporte em alguns casos ainda pode ser vantajoso. Isso, é claro, se a mercadoria recebida chegar em boas condições e corresponder às especificações. E se não for assim? Se o produto apresentar defeito ou for diferente do solicitado? Neste caso, ao devolvê-lo, você tem duas alternativas: pedir o reembolso do valor pago ou a substituição da mercadoria. No primeiro caso, mesmo que tudo corra nos conformes e você receba todo o seu dinheiro de volta (algumas empresas retêm uma parte do valor pago), terá que arcar com as despesas de transporte em dobro, pagando tanto o envio quanto o retorno da mercadoria. Sem falar na questão do imposto: você deve impostos de importação e ICMS sobre uma mercadoria que foi devolvida? No caso da substituição, as despesas de transporte triplicam e a questão dos impostos permanece aberta: você terá que pagá-los ambas as vezes que a mercadoria ingressar no país? Se não, como proceder para evitar a cobrança em dobro?

Resumindo: a internet ao pôr a nosso alcance o comércio eletrônico, promoveu a possibilidade de fazermos excelentes negócios. Desde que tudo corra bem.

Se não...

B. Piropo