Escritos
B. Piropo
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22/04/1996
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Há alguns meses recebi um "Teclado Natural" da Microsoft para avaliação. Para quem não sabe, trata-se de um teclado comercializado pela Microsoft cuja característica mais evidente é seu formato pouco convencional: ao invés da forma retangular a que estamos habituados, com suas quatro linhas de teclas paralelas coroadas pelas teclas de função, o teclado natural da Microsoft exibe um formato sinuoso bastante peculiar.

A distribuição das teclas também é diferente. Como nos teclados convencionais, o conjunto de teclas numéricas se situa na extremidade direita, imediatamente ao lado das teclas auxiliares. Mas a semelhança pára aí. Porque todas demais teclas se situam em dois blocos formando um ângulo que acompanha a sinuosidade do teclado. É como se alguém partisse um teclado verticalmente ao meio e dobrasse as duas metades para trás. No espaço que se forma no centro do teclado localizam-se os leds indicadores das travas de maiúsculas, teclado numérico e Scroll Lock. A única tecla que se estende entre os dois blocos, unindo-os na base, é a barra de espaço. A idéia é que cada bloco deve ser acionado por uma das mãos e sua posição ligeiramente angulada corresponde ao ângulo (de cerca de 45) dos antebraços ao se aproximarem do teclado.

Juntamente com o teclado é fornecido um programa, o IntelliType, cuja função básica é dar suporte ao teclado e acionar uma versão incrementada do TaskManager não compatível com Windows 95 (que incorpora o suporte para o teclado natural). Por isto não foi instalado nesta máquina que vos fala. Além disto, o teclado natural tem três teclas adicionais situadas junto às demais teclas de controle. Duas delas, as teclas "Windows", localizam-se imediatamente ao lado das teclas Alt, em ambos os blocos de teclas. E uma terceira, a tecla "Application", situa-se entre a tecla "Windows" e a tecla Control do bloco de teclas da mão direita. Ela serve apenas para abrir o menu de contexto do objeto selecionado (como ao premir o botão direito do mouse ou teclar Shift+F10). Já a tecla Windows, como as demais teclas de controle, pode se combinar com outras. Sozinha, abre o menu Iniciar (como ao teclar Ctrl+Esc ou clicar no botão "Iniciar"). Mas combinada com F1 abre a ajuda de Windows. Já Win+Pause abre a janela de Propriedades do sistema, Win+M minimiza todas as janelas abertas, enquanto Win+Shift+M retorna as janelas ao estado anterior. Há diversas outras combinações possíveis - o difícil é se lembrar delas. Talvez, se você treinar um bocado, estas teclas possam vir a ser de alguma utilidade. No que me diz respeito, jamais consegui me habituar a elas. A tecla Application, confesso que nunca usei. Quanto à tecla Win, adquiri o hábito de premi-la apenas quando, ao final de uma sessão de trabalho com Windows 95, precisava acionar a função "Desligar" do menu Iniciar. E mais nada.

Eu passei quase cinco meses usando o teclado natural em minha máquina principal, tempo mais que suficiente para formar um juizo. Então, vamos a ele. Para começar: se o leitor amigo é do tipo que cata milho e usa apenas um dedo de cada mão para digitar, desista. Este teclado não foi feito para você. E note que não me refiro á velocidade (conheço gente que digita com uma rapidez impressionante usando apenas dois dedos, né Cora?), mas ao fato de que, para tirar o mínimo proveito do teclado natural é preciso usar os dez dedos. Isto é uma conseqüência óbvia dele ter sido concebido para se ajustar ergonomicamente à posição das mãos de um digitador que usa os dez dedos. Coisa que faço desde os quinze anos quando resolvi empregar em um curso de datilografia parte do tempo que passava vagabundeando depois da escola - a única decisão sensata de minha adolescência.

Agora, depois deste tempo todo convivendo com o bichinho e batucando diariamente em suas teclas, minha impressão dele é, digamos, positiva mas não entusiástica. Positiva porque, sem dúvida, para digitar nem há o que se discutir: este formato de teclado é um achado, coisa de gênio. A posição das teclas é tão bem pensada que eu sou capaz de digitar uma coluna inteira como esta sem levantar as mãos do apoio situado na base do próprio teclado, na parte mais "gorda" da sinuosidade central - que serve justamente para isto. O que diminui extraordinariamente o cansaço. Ou seja: para digitar, do ponto de vista ergonômico, o teclado natural é absolutamente maravilhoso.

Então porque a falta de entusiasmo? Bem, a culpa é da própria Microsoft que, antes de inventar o teclado natural, inventou o mouse (tá bom, isso é só força de expressão, eu sei que não foi a MS quem inventou o mouse). E uma parte significativa do tempo que se passa ao teclado não se está digitando, mas usando o mouse. Acontece que para ser ergonomicamente eficaz e suportar as duas mãos simetricamente, o eixo entre os dois blocos de teclas alfanuméricas do teclado natural deve se situar exatamente em frente ao umbigo do digitador - e não ficar ligeiramente deslocado para a esquerda, como o do meu velho teclado. E como ele é bastante mais largo que o teclado convencional, deslocou meu mousepad uns bons vinte centímetros para a direita. Resultado: sempre que uso o mouse, meu cotovelo fica pendurado no ar e não mais apoiado no braço da cadeira. Um desastre do ponto de vista ergonômico e a causa provável de uma dorzinha renitente no meu cotovelo direito que me acompanha há uns dois meses (alguns detratores insinuam que a causa é a idade, mas decididamente estão enganados: o cotovelo esquerdo é da mesma idade que o direito e não dói nem um pouquinho).

Então o que fazer? Bem, levei menos de dois meses para me acostumar ao teclado natural. Agora, instalo de novo meu velho teclado português e observo o resultado. Se em menos de dois meses me acostumar novamente a ele e a dorzinha sumir do cotovelo, fico com o bicho e temos conversado. Se não, aproveito que em junho vou à Comdex Spring e volto do hemisfério norte com um teclado natural debaixo do braço.

Que lá já encontrei por um terço do que cobram por ele aqui neste país de ricos.

B. Piropo