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11/09/1995
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Esta semana recebi uma carta de um capitão de longo curso nos bravios mares da informática: começou há doze anos em um Sinclair com fita cassete, teve TK-2000, MSX, XT, 386 e agora está montado em um bravo 486 DX2/66 com tudo a que tem direito: placa de som, CD-ROM e coisa e tal. Trata-se do meu amigo (que só conheço de carta, mas nem por isso é menos amigo) Augusto César Vidal. Um médico que certamente por modéstia se faz de desentendido mas que no fundo é um micreiro dos mais espertos. O Augusto não entende porque tanto alvoroço com o lançamento de Windows 95. Pois leu na Informática Exame "que em algumas situações ele é muuiiiiito mais lento". E cita o tempo de carga de alguns programas, comparando Windows 95 com Windows 3.1 e mostrando que em Windows 3.1 a carga é muito mais rápida. O mais interessante, porém, é seu qüestionamento sobre a multitarefa. Diz ele: "não é o que faço usando o DesqView no bom DOS?". E declara que é no ambiente DOS/DesqView "que se sente mais em casa". Diz ele que só usa Windows 3.1 ou 3.11 "quando não tem jeito". Pois olhe, mestre Augusto, que eu não fazia a menor idéia de que ainda havia gente pelaí usando a dupla DOS/DesqView. Que, aliás, me traz as mais doces lembranças. Para quem não sabe: o DesqView, da Quarterdeck, foi (ou, tendo em vista a carta do Augusto, é) o melhor programa para computador que já conheci (o XTree vem logo depois, encostado). Permitia uma multitarefa inacreditavelmente estável com uma interface em tela texto sobre o mais puro DOS. Coisa de gênio. Eu mesmo usei-o durante anos e somente o deixei de lado quando fui obrigado, muito a contragosto, a migrar para Windows 3.0 pela facilidade para configurar todos os meus programas para uma impressora que havia comprado e tinha uma enorme dificuldade de encontrar drivers (era uma impressora a laser, e fora de Windows eu teria que conseguir um driver para cada programa que imprimisse algo - dura era a vida do micreiro antes das interfaces gráficas). Eu me lembro que fui um dos que mais resisti a adotar Windows. Acostumado com a rapidez e eficiência dos programas em tela texto, achava aquelas figurinhas uma enorme basbaquice. Coisa de criança ou idiota. E costumava citar a conhecida máxima: "faça algo que qualquer idiota seja capaz de usar e somente os idiotas quererão usar". E quanto mais mexia com Windows, menos acreditava que aquilo fosse "pegar". Nas mesas dos micreiros, talvez, pensava eu. Mas nas grandes corporações, nem pensar. As empresas usam micro para coisas sérias, argumentava. A interface gráfica era bonitinha, facilzinha de usar, mas de séria não tinha nada. Assim provava irrefutavelmente a meus amigos que eles jamais veriam um computador rodando Windows em um escritório que se prezasse. E continuava aferrado ao meu DeskView. Afinal, sentia-me inteiramente a vontade dentro dele, fazendo tudo o que precisava fazer com meu micro na segurança e estabilidade de uma multitarefa extraordinária. O que mais queria da vida? Foi então que, por causa da impressora, comecei a usar Windows. Uma porcaria, achava eu. Figurinhas bonitinhas, mas um negócio lento e sobretudo instável: uma coisa chamada UAR (Unrecoverable Application Error, que mais tarde passou a chamar-se GPF e agora chama-se exception-não-sei-o-que) volta e meia me travava a máquina e deitava a perder horas de trabalho. No entanto, que jeito? Quando é inevitável, nada a fazer senão relaxar e aproveitar. Pois não é que com o tempo fui descobrindo as delícias das interfaces gráficas? Esse negócio de não ter que configurar cada programa para cada periférico era sensacional. E o mouse realmente simplificava a vida. Fuça daqui, fuça dali, acabei por descobrir outras tantas facilidades. Ao mesmo tempo em que começava a tropeçar cada vez mais com máquinas rodando Windows nos mais respeitáveis escritórios da praça. Acabei deixando pra lá o DesqView e já nem me lembrava mais dele até receber sua carta, mestre Augusto. Pois é isso, meu amigo. Windows 95 já chegou. Será ele tão melhor assim que Windows 3.x? A Microsoft diz que sim. Seus críticos dizem que não: Windows 95 é Windows 3.x maquilado. Mas o fato é que está aí. E chegou para ficar: não se brinca com um produto que despachou oito milhões de cópias no primeiro dia. Por enquanto Windows 95 ainda roda os programas DOS e Windows 3.1. Mas só por enquanto. Por quanto tempo, não sei. Se você migrar agora para ele (ou para o OS/2 Warp, também um sistema operacional de 32 bits com interface gráfica), vai quebrar a cara para aprender os novos macetes, evidentemente. Mas pelo menos estará quebrando a cara juntamente com todos os outros mortais e terá com quem discutir as dificuldades. Se não migrar, vai ter que ficar com seus programas DOS em tela texto rodando sob DesqView. Que funcionam, evidentemente. Mas acho bom fazer um bom estoque deles. Porque logo logo não vai ser fácil encontrar um bicho desses para comprar. E, pior, diga-me lá, mestre Augusto: com quem irá você discutir seus problemas com o DesqView? Mudando de assunto: semana passada, em uma movimentada esquina de Copacabana, embora com o sinal aberto eu aguardava que os carros a minha frente se movessem para não fechar o cruzamento. Atrás de mim, no Santana prata LQ 3766, um desgrenhado senhor (quase escrevi cavalheiro, mas o termo, decididamente, não se aplica) buzinava aflito para que eu avançasse. Quando os carros se moveram um pouco e eu, afinal, segui em frente, ele arrancou, postou-se a meu lado e descompôs-me de dedo em riste, como se o fato de eu ter interrompido sua marcha triunfal até a próxima espera fosse o pior dos pecados. E adiante conseguiu afinal seu intento: ainda no engarrafamento, triunfante, atravessou-se no meio da rua obstruindo a passagem e o direito de prosseguir seu caminho em paz dos que estavam na transversal. Vivendo no Rio de Janeiro já me acostumei com as hordas de gersons que não se incomodam com os embaraços ou prejuízos que causam a seus concidadãos desde que levem a menor vantagem em qualquer coisa. Mas não consigo entender a atitude imbecil dos que insistem em fechar os cruzamentos quando sabem que não poderão prosseguir, já que atravancam o trânsito e ficam ali parados sem levar vantagem alguma. No início irritei-me com o pobre infeliz. Depois, envergonhei-me por pertencer à mesma espécie daquele animal. Mas acabei por sentir alguma admiração por ele. Que, afinal, conseguiu uma façanha: com um único gesto grosseiro e pouco inteligente esgotou em sua total plenitude ambos os sentidos da palavra "estupidez". PS: Amanhã tem reunião do Grupo de Usuários do OS/2, às 19 horas no RDC da PUC, na Gávea. A primeira depois do lançamento oficial do Windows 95. Deverá ser animada... B. Piropo |