Anteriores:
< Trilha Zero > |
|
|
10/04/1995
|
<
Rumos da Indústria
VI - > |
Já vimos que desde o DOS 1.0 até Windows 95 o conceito de sistema operacional evoluiu do mínimo necessário para fazer a máquina funcionar até um soberbo conjunto de utilitários e aplicativos de uso geral. Citando Schulman: "A Microsoft não somente detém o quase monopólio do sistema operacional como também está continuamente expandindo a definição do que pertence ao sistema operacional". Nesta ordem de idéias, nada impede que a MS dê um passo adiante e integre o Office a uma futura versão de Windows, criando um "sistema operacional" que dispense quaisquer outros aplicativos. Ainda segundo Schulman: "O objetivo da Microsoft é claro: fornecer um software de uso geral para os micros de mesa. A estratégia da Microsoft para atingir esse objetivo é continuar agregando funcionalidade à Windows e continuar promovendo o Office como camada de aplicativos 'integrada' à Windows". Se ela conseguir atingir seus objetivos, quais seriam as perspectivas das demais softhouses? Em princípio, teriam muito pouca chance de sobreviver caso decidam competir diretamente com a MS. Softhouses como a Corel (por enquanto) podem respirar aliviadas, já que a MS ainda não entrou na arena dos programas gráficos de alto desempenho. Mas por quanto tempo? Uma análise superficial da história da indústria na última década mostra que a MS tem penetrado em quase todos os nichos do mercado. Sobre isso, diz Schulman: "... o único mercado que eu ouvi dizer que a Microsoft não pretende ingressar é o dos screen savers pornográficos e multimídia para adultos. Como me disse um funcionário da companhia: 'nos olhamos cuidadosamente o software para adultos e decidimos deixar esse dinheiro na mesa'. É difícil imaginar outra área na qual a Microsoft pretenda deixar o dinheiro na mesa". Vejamos o mercado dos aplicativos Windows. Provavelmente você não compraria um programa para rodar em Windows se ele não explicitasse claramente que é compatível com Windows. Mas acontece que para isso é preciso permissão da Microsoft, que detém direitos sobre a marca Windows (só o conseguiu recentemente, já que "windows" significa "janelas" em inglês, uma palavra de uso corrente, e houve muita discussão jurídica até que os direitos fossem legalmente concedidos). E consta que, para alegar compatibilidade com Windows 95, a MS imporá determinadas restrições: o programa deverá aderir à API Win32, rodar não apenas em Windows 95 como também em Windows NT 3.5 e, caso trabalhe com arquivos, suportar OLE 2.0 e correio eletrônico (o menu "File" deverá exibir pelo menos a função "Send" ou "Send Mail"). De acordo com a MS, essas exigências destinam-se a criar uma sinergia eficaz entre o produto e o sistema operacional. Sobre isso, comenta Schulman: "A questão é: eficaz para quem? A maioria das exigências parece estar mais ligada aos desejos da MS que aos dos usuários. Por exemplo: embora a API Win32 seja boa, muitos programas simplesmente ficam maiores quando portados para código de 32 bits. E a exigência relativa a NT parece nada mais que uma tentativa de usar o controle da MS sobre o grande mercado futuro de Windows 95 para alavancar seu opaco Windows NT. E a exigência de OLE 2.0 é singular, dado que a própria MS não usou OLE para a shell de Windows 95". Sejam as exigências válidas ou não, o fato é que para comercializar um produto que proclame compatibilidade com Windows, as softhouses dependem da MS. Uma outra possibilidade seria se render definitivamente ao domínio da MS e, ao invés de concorrer, passar a colaborar com ela, usando o Visual Basic for Applications e o Office Development Kit para desenvolver aplicativos que "rodem no Office". Com isso, passariam a trilhar o caminho já desbravado por empresas que viveram muitos anos desenvolvendo "add-ins" para customizar o Lotus 123 ou o DBase. Mas nesse caso, o grau de subordinação à MS seria ainda maior. A MS criou recentemente um programa de compatibilidade com o Office, segundo o qual as softwares que pagarem a módica taxa de mil dólares (logo voltaremos a falar sobre isso) terão o direito de exibir o logo de compatibilidade com o Office e adotar o "look and feel" dos aplicativos Office, incluindo barras de ferramentas e estruturas de menus. Sobre isso, afirma Paul Bonner em seu artigo da Computer Shopper de outubro de 94: "Só há um problema: se seu aplicativo competir com qualquer aplicativo ou ferramenta oferecido pela MS (grifo nosso) você não é elegível para participar do programa Office Compatible." Ou seja: você só pode entrar no mercado de "aplicativos Office" se não concorrer diretamente com a MS. Aceitar essas restrições corresponde a uma rendição completa e incondicional ao domínio da MS sobre o mercado de aplicativos. Em princípio, tudo isso parece lícito, já que Windows e Office são marcas registradas da MS e o "look and feel" de seus aplicativos é propriedade intelectual da empresa. Mas a partir do momento que a MS conseguir impor o pacote Windows + Office como "sistema operacional", o pagamento de uma licença à MS para que programas de terceiros rodem nessa plataforma corresponderia, nos dias de hoje, ao pagamento de uma licença para que um programa rode, por exemplo, no DOS. Algo parecido já existe atualmente: a Nintendo permite que terceiros desenvolvam jogos para rodar em seus consoles, desde que paguem uma licença. O tema não passou despercebido a Schulman, que comenta: "No que poderia ser os primeiros passos experimentais no sentido de um programa de certificação ao estilo da Nintendo, a Microsoft publicou novas orientações sobre o que os aplicativos devem fazer para se qualificar para o logotipo Windows 95 no produto e na publicidade". Essa não foi a primeira vez que ouvi falar nessa possibilidade. Há cerca de um ano, na Comdex SP, entrevistei John Dvorak, o extraordinário colunista americano. Tenho uma autocrítica suficientemente aguçada para perceber que, se sou um razoável escrevinhador, como jornalista sou um desastre. Portanto, não é de admirar que a entrevista tenha sido um fiasco, já que logo depois de iniciada degenerou em descarado bate-papo. Mas um bate-papo de qualidade inigualável. Durante o qual, discorrendo sobre as perspectivas do mercado da informática e o virtual domínio que a MS exercia sobre esse mercado, John Dvorak manifestou o mesmo receio. Que, mais tarde, colocou em letra de forma em seu extraordinário livro "Dvorak Predicts" (Osborne McGraw-Hill, 1994), ao dizer: "Se conseguir o controle total sobre Windows, a MS estabeleceria um arranjo de licenciamento como o da Nintendo? Porque não? Se manejado corretamente, pareceria um serviço público. A mensagem da MS poderia enfatizar que o licenciamento visaria garantir que o público somente recebesse código de boa qualidade, escrito por vendedores aprovados. Isso soa bem." Resumindo: se uma empresa conseguir dominar o mercado a ponto de exercer o monopólio virtual dos sistemas operacionais, poderá exigir que as softhouses paguem uma licença por cópia vendida de seus programas para que eles rodem no sistema. Se isso ocorrer, quem você acha que vai pagar os custos dessa licença? B. Piropo |