Escritos
B. Piropo
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20/06/94

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Há algum tempo, no CentroIn e no Inside, os dois BBS que freqüento, rolou uma discussão sobre proteção de software. Entrei nela, literalmente, como Pilatos no credo: meu nome foi citado em uma mensagem que, por isso, foi selecionada por meu mail reader, o excelente UniQuick. Discutia-se um produto em particular, que eu não conhecia por razões que ficarão claras adiante. Portanto, abstive-me de participar da discussão. Mas não de dar minha opinião sobre proteção de software em geral. E dei-a em uma mensagem à Patrícia Peres, que faz parte de um seleto grupo de amigos com os quais só "converso" via BBS, sem jamais ter tido o prazer de conhecer pessoalmente. Pois a Patrícia achou interessante que eu tornasse pública minha posição sobre o assunto e a comentasse aqui na Trilha Zero. Pois então, atendendo a pedidos, lá vai:

Acho que proteção de software prejudica tanto ao usuário quanto à softhouse. Ao usuário, por razões evidentes. × softhouse por razões menos óbvias, mas igualmente ponderáveis. A primeira é que não existe proteção inviolável: não há programa protegido sem cópias piratas na praça, livres de proteção. A segunda é que os custos do software desprotegido são menores, pois não há que se pagar a proteção nem arcar com as despesas para resolver problemas com instalação. E, finalmente, a terceira: estou convencido que produtos desprotegidos vendem mais.

Parece paradoxal, eu sei. Mas cheguei à essa conclusão baseado em meu próprio comportamento à época em que comprava programas (hoje a maioria dos que uso me foram enviados pelas softhouses para avaliação). Pois jamais comprei um que não houvesse "experimentado" antes: rodava uma cópia pirata e avaliava. Se o programa não me agradava, não usava - portanto, não causava prejuízo algum à softhouse. Se agradava, comprava. Por que comprava, se já tinha a cópia pirata? Ora, porque me interessavam os manuais e a assistência técnica. Sem contar que, comprando, regularizava minha situação perante à lei, à ordem e à minha consciência.

Creio que quando o produto é de boa qualidade, não há melhor propaganda que uma boa cópia pirata. Um programa que pode ser "experimentado", se for bom de fato, ganha compradores em penca. Por outro lado, nem todos os que experimentam e gostam irão comprar: alguns continuam usando a cópia pirata. E isso não representa menos cópias vendidas? Bem, acredito que, destes, só se deve contabilizar como vendas perdidas os que de fato comprariam e só deixaram de fazê-lo porque dispõem da cópia pirata. Que, garanto, não são muitos: a imensa maioria dos usuários prefere rodar um programa comprado legalmente. Se o produto é de boa qualidade e vendido por um preço justo, o usuário compra. Em geral, se não compra é porque não pode. Logo, não compraria mesmo que o programa fosse protegido. Portanto, o que deve ser comparado é o número dos usuários que compraram porque experimentaram e gostaram com o dos que realmente comprariam e só não o fizeram porque estão rodando a cópia pirata. E, garanto, os primeiros excedem de muito os últimos. Logo, um bom programa desprotegido vende mais.

Mas isso só diz respeito ao aspecto comercial do problema. Há outro muito mais importante: o aspecto ético. Que regula as relações entre uma empresa e seus clientes. Pois nem os maiores defensores da proteção contra cópias discutem uma evidência: programas protegidos são uma chateação. Durante muito tempo eu mantive um deles em meu HD, o Fácil, um ótimo editor de textos. Pois perdi a conta das vezes que, por esquecimento, a instalação "dançou" ao reformatar o HD. Desisti. Só voltei a usá-lo quando recebi uma cópia desprotegida, personalizada (o que me parece a solução ideal). Que uso até hoje - na verdade, a estou usando agora mesmo. Pena que a versão esteja tão desatualizada: a nova, que recebi, estava protegida e nem me dei ao trabalho de instalá-la.

Portanto, usar um programa protegido é uma indiscutível chateação. Mas chateação para quem? Ora, para quem compra: piratas usam cópias desprotegidas. Logo, quem protege programas pune justamente a quem mais deveria paparicar: o freguês, aquele que deve ter sempre razão, o cara que pagou, que sustenta a empresa com seu chorado dinheirinho. Portanto, acho que proteger programas é uma enorme falta de respeito com o freguês e não uma arma contra a pirataria. Destas, a melhor que conheço é desenvolver programas bons e vendê-los por um preço decente. Proteção não inibe pirataria: só dá mais trabalho ao pirata. E pune o freguês.

Mas não discuto o direito das softhouses protegerem seus programas. Trata-se de uma decisão comercial e ética, e cada um trata o freguês como acha que ele merece. Em outras palavras: quem achar que deve vender programas protegidos, que os venda. Mas sempre há a contrapartida: quem achar que deve comprá-los, que os compre. E aí está a raiz da questão. Pois é o mercado que regula a coisa toda. Procure, nos EUA, um programa protegido contra a cópia. Veja lá: não me refiro a proteção por hardware nem a esquemas que exigem a entrada de códigos que só podem ser encontrados nos manuais, como certos joguinhos. Me refiro ao tipo de proteção que só dá direito a um número determinado de instalações. Ganha um dôce para cada um que encontrar à venda.

E por que não se encontram à venda? Simples: porque, por lá, programa protegido ninguém compra. E, se ninguém compra, o produto não vende. Foi não comprando que o mercado americano liquidou com a proteção contra cópia. Logo, qualquer discussão sobre o assunto me parece perfunctória - para usar uma palavra que vai levar alguns de vocês ao dicionário. Se há quem compre produtos protegidos, haverá quem os venda. Se não, não. E temos conversado.

Eu, de minha parte, faço o que julgo correto. Repito: respeito o inalienável direito das softhouses protegerem seus programas. Mas me reservo o não menos inalienável direito de me abster de usálos. Programa protegido não chega a menos de dez metros de minha máquina. E quando recebo algum para avaliação, dispenso: nem me dou ao trabalho de instalar.

E foi por isso que não entrei naquele papo do BBS: não costumo discutir assuntos que não entendo. Afinal, careço totalmente de experiência para discutir qualquer programa protegido...

B. Piropo