< Trilha Zero >
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10/01/2005
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< A eterna luta do > |
Christopher Pierson é um pobre coitado. Aos 40 anos, pai de três crianças (uma menina e dois meninos), duas das quais portadoras de diabetes e a mais afetada exigindo cuidados permanentes, vive com a família em uma casa de Ruskington, Lincolnshire, na Inglaterra. De acordo com um artigo publicado no jornal britânico Sun, seu pai foi um piloto da RAF que participou de diversas missões de bombardeio na Segunda Guerra Mundial e seu irmão era um respeitado líder de esquadrão, também da RAF. Enquanto isso, Christopher pouco fazia além de cuidar do filho doente e passar o resto do tempo em frente ao computador. Segundo seus vizinhos, era uma pessoa solitária e profundamente alquebrada pelas vicissitudes da vida. Há cerca de dez anos sua mulher deu à luz um menino que não sobreviveu. Pouco antes do Natal um de seus filhos esteve à beira da morte e um tio faleceu. Em suma: o mundo não vinha tratando bem Christopher Pierson. E ele reagiu. Há formas e formas de reagir. Por exemplo: Jorge Márcio Pereira de Andrade teve dois filhos com paralisia cerebral (ou distúrbio de eficiência física – DEF – como ele classifica). Paralisia cerebral não tem causa genética nem há razão que explique porque uma criança nasce com este distúrbio. Apenas nasce. É raro acontecer, e quando acontece afeta de forma dramática a vida dos pais. Pois esse fenômeno raríssimo atingiu Jorge duas vezes. Ele poderia ter se revoltado contra o mundo. Em vez disso, segundo suas próprias palavras, “quando aconteceu da segunda vez achei que deveria tomar alguma atitude a respeito”. E tomou: criou a Defnet Como eu disse, há formas e formas de reagir. Enquanto Jorge Márcio resolveu se empenhar para tornar desconhecidos menos infelizes, Christopher Pierson, “de mal” com o mundo, decidiu distribuir um pouco de infelicidade a seus compatriotas. Pois ocorre que alguns deles recorreram ao boletim de notícias da Sky News Online para solicitar informações sobre familiares que estavam na região da Ásia afetada pelo tsunami do final de dezembro último e ainda não haviam sido localizados. Pois bem: através de uma conta falsa de correio eletrônico aberta no provedor AOL, fazendo-se passar por uma autoridade governamental transmitindo notícias recebidas de um órgão do Governo Britânico na Tailândia (Foreign and Commonwealth Office), Pierson enviou mensagens para 35 endereços obtidos no Sky News informando que o Governo do Reino Unido lamentava a confirmação da morte das pessoas desaparecidas sobre as quais os destinatários procuravam notícias. Uma forma segura de tornar alguém infeliz. Não sei que tipo de motivação leva pessoas a proceder assim. Talvez Pierson achasse que se dividisse a infelicidade com desconhecidos sua parcela ficaria menor. Talvez quisesse apenas se vingar da humanidade. A razão, não sei. Mas sei que ele se deu mal. Através do remetente da conta usada para enviar as mensagens, [email protected], não foi difícil localizá-lo. Detido no último dia do ano passado, Pierson teve seu computador confiscado e, na última segunda-feira, foi levado ao Tribunal de Horseferry Road, em Londres, onde admitiu sua culpa, se disse arrependido e pediu desculpas a todos os que magoou, declarando que o incidente fora a “culminação de algumas coisas terríveis que lhe haviam afetado nos últimos dez anos”. O que não impediu seu enquadramento na lei de comunicações maliciosas e danos públicos. Seu advogado alegou insanidade, mas como não foi detectado nenhum problema mental Pierson vai permanecer detido pelo menos até ser julgado em 24/01 pela Juíza Daphne Wickhan. E o que tem tudo isso a ver com uma coluna de informática? Ora, tudo a ver. Porque, tanto no caso em que o vilão decidiu reagir distribuindo infelicidade quando no caso em que o herói reagiu tornando pessoas felizes, os instrumentos de reação foram os mesmos: o computador e a Internet. Ambos estão a seu alcance. Comece bem o ano: siga o exemplo do Márcio e use-os para o bem. B. Piropo |