Sítio do Piropo

B. Piropo

< Trilha Zero >
Volte de onde veio
03/12/2001

< Meta “reduzida” >


Em junho a temperatura do microprocessador de meu micro oscilava entre 52 e 54 graus Celsius. Nada mau para um sistema trabalhando em um ambiente cuja temperatura se mantinha entre vinte e cinco e trinta graus. Afinal, a CPU é um parrudíssimo Athlon de 1,33 GHz e é sabido que nesses microprocessadores a dissipação de calor é um fator crítico (se você tem dúvidas, visite o sítio “Tom’s Hardware Guide” para consultar o artigo “How modern processors cope with heat emergencies”, em <www4.tomshardware.com/cpu/01q3/010917/index.html>, ilustrado com vídeos que testemunham uma interessante experiência sobre a influência da dissipação de calor no funcionamento dos microprocessadores modernos e, sobretudo, da ação – ou inação – dos mecanismos internos de proteção desses chips contra calor excessivo). Mas ainda assim eu não estava satisfeito. Sabia que tempos piores viriam e por isso resolvi aplicar um truque que aprendi na revista PCs para baixar a temperatura do microprocessador: polir a base do dissipador de calor da CPU, a superfície que entra em contato direto com o chip.

A forma mais simples de fazê-lo é usar lixas metálicas de granulação bem fina e pasta de polir. Remova o dissipador de calor da CPU com cuidado (e bota cuidado nisso: se você danificar a CPU ou quebrar as pequenas abas do soquete onde se encaixam as duas extremidades do grampo metálico que comprime o dissipador contra a CPU, pode inutilizar o microprocessador ou o soquete e ter um prejuízo considerável; se nunca instalou ou removeu uma CPU, procure ajuda de um amigo mais experiente – e se tentar sozinho e danificar o soquete ou CPU não reclame, que eu avisei). Considere o polimento encerrado quando conseguir enxergar sua face refletida na base do dissipador. Depois, passe uma camada fina de pasta térmica entre o chip e a superfície recém polida e reinstale o dissipador com o devido cuidado, sem esquecer de ligar a ventoinha à tomada de força. Eu fiz isso e consegui uma nada desprezível redução de quatro graus Celsius na temperatura média de minha CPU.

O tempo passou, chegaram novembro e o calor. E descobri, preocupado, que nos dias mais quentes da semana passada a temperatura de minha CPU chegou aos 59 graus Celsius. Então me dei conta que breve serei obrigado a ligar o ar refrigerado de meu escritório doméstico.

Acontece que quando o governo fixou a meta do racionamento de energia em vinte porcento, calculou-a aplicando essa porcentagem sobre o consumo dos meses mais frios do ano. E acontece que nos meses de dezembro e janeiro, o auge do verão, o consumo de energia em minha casa é superior ao dobro do consumo no inverno – justamente devido ao uso do ar refrigerado.

Pois bem: exatamente na semana em que eu me dei conta que sem ar refrigerado não seria possível continuar usando meu micro o governo anunciou que, devido ao retumbante sucesso da campanha de economia de energia, estava nos concedendo a benesse da redução da meta para apenas sete porcento. Quanta magnanimidade!

Mas peraí: sete porcento de que, cara pálida? Do meu consumo no inverno? Ora, mas meu consumo de energia no inverno é muitíssimo menor que no verão. Então, presumindo que no verão ele seja apenas duas vezes maior que no inverno (na verdade, é mais que isso), “reduzir” a economia para sete porcento (o que corresponde a fixar uma meta de consumo de 93 porcento), mas aplicando essa porcentagem sobre o consumo do inverno, corresponde a limitar meu consumo no verão a apenas 46,5 porcento do usual. Quer dizer: em vez de ser reduzida para vinte porcento, minha meta de economia na verdade foi aumentada para 53,5 porcento. E, se você usa ar refrigerado no local onde mantém o micro, como se recomenda, seu caso não há de ser muito diferente. Experimente: calcule a média do consumo de dezembro e janeiro últimos, compare-a com a nova meta de economia recentemente divulgada e veja se a sua foi, efetivamente, “reduzida” para sete porcento.

Ter um governo que, por pura incompetência, mergulha o país em uma crise de energia porque proibiu investimentos no setor energético para facilitar a privatização, a gente agüenta. Ter um governo que não é suficientemente honesto para admitir isso e joga a culpa em São Pedro alegando que o problema se deve à falta de chuvas, dá para aturar. Mas ter um governo que faz tudo isso e, quando eu mais preciso de energia para trabalhar, me obriga a reduzir o consumo a menos da metade e ainda tem o desplante de dizer que está “reduzindo” a meta de economia para menos de dez porcento, isso é demais.

Tem nada não: ano que vem tem eleição e aí a gente conversa.

B. Piropo