Sítio do Piropo

B. Piropo

< Trilha Zero >
Volte de onde veio
09/07/2001

< Serviços e desserviços >


Na era dos caixas automáticos possibilitados pela informática e telecomunicações, pouca gente ainda lembra de como era duro precisar de uma graninha no final de semana e não ter de onde sacá-la. A facilidade do acesso à conta bancária a qualquer hora e de qualquer lugar é realmente um conforto. Para quem quer. Porque para quem não quer, além de indesejável, é perigoso.

Eu tinha mais de um cartão de crédito. Um belo dia, sem que eu o solicitasse, após a renovação recebi dois deles ostentando no verso os dizeres “Banco24Horas”. Depois vieram as senhas e fui informado que com elas eu poderia sacar uma certa quantia em qualquer caixa automático filiado ao sistema. Como acho escorchantes os juros cobrados por esse tipo de crédito, inutilizei as senhas para não correr o risco de cair em tentação e esqueci o assunto – não sem antes louvar mais esse pequeno milagre que a informática permitiu engendrar.

Dia desses um amigo passou por uma experiência que está se tornando corriqueira nessa cada vez menos leal e mais heróica cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro: um “seqüestro relâmpago”. Marginais, sob a mira de armas e debaixo de enorme truculência, abordaram-no em plena via pública e levaram-no para um valhacouto onde o mantiveram cativo juntamente com seu filho enquanto dois elementos do grupo, de posse de seu cartão de débito bancário e da senha por ele fornecida, sacavam até o limite permitido no caixa automático. Vou me abster de relatar os momentos de terror e violência a que foram submetidos meu amigo e seu filho quando os biltres retornaram após verem frustrada a primeira tentativa de saque por terem confundido a senha, mas asseguro que ninguém gostaria de passar por aquilo.

Foi então que me dei conta do risco que corria portando um cartão de crédito que permite acesso a alguns milhares de reais através de uma senha que já não tenho. O que ocorreria comigo diante da insistência dos gentils-homens que eventualmente me seqüestrassem para que eu lhes fornecesse uma senha que ignoro? Conseguiria eu fazê-los entender que, se eu negava mesmo diante do explosivo poder de argumentação de um trezoitão, era porque de fato não a possuía? Sobreviveria eu à veemência da argumentação? Melhor não tentar descobrir. Liguei para os indigitados cartões de crédito e solicitei que me fossem enviados exemplares sem direito ao serviço. Algo aparentemente simples, já que bastava alterar meu registro no banco de dados e enviar novo cartão.

Se seu cartão de crédito também lhe “oferece” esse serviço e você não o deseja, tente fazer o mesmo. Procure convencer ao banco que, de fato, para quem o quer, o serviço é realmente uma mão na roda mas para quem não o deseja e desconhece a senha implica grave risco de vida. Veja o tipo de “solução” que lhe será sugerida (a mim tiveram o desplante de oferecer nova senha e reduzir o limite para diminuir o eventual prejuízo). Assombre-se diante da insensibilidade face ao risco a que submetem os clientes por pura cupidez. Assuste-se frente à recusa. E descubra que não tem jeito: querendo ou não, se você precisa do cartão de crédito, vai ter que engolir o serviço que lhe é enfiado goela abaixo e viver sobressaltado enquanto carregar aquela bomba-relógio.

Naturalmente não sou contra o serviço – desde que seja facultativo. Obrigatório, não quero. O que me levou a manter apenas um terceiro cartão de crédito. Que não oferece o serviço e não põe minha vida em risco.

Pois se há quem tente me obrigar a ter o que não quero, há serviços que quero e já não tenho. Como o que me era prestado pelo Detran-RJ. Para saber quantos pontos tinha acumulado no prontuário, bastava ao cidadão consultar o sítio do Detran em <www.detran.rj.gov.br>. Mas desde outubro passado, no atalho correspondente se encontrava apenas uma página informando que o serviço fora suspenso temporariamente. Atualmente, nem isso. O que me leva a crer que não mais retornará.

Ora, se a informação era fornecida é porque é possível fornecê-la. Portanto, o problema não há de ser tecnológico. Então por que um serviço tão útil foi interrompido?

Saber em  quantos pontos foi penalizado é um direito do cidadão. Na página principal do sítio, a Mensagem do Presidente informa que “o acesso democrático à informação é o principal objetivo da home-page do Detran-RJ”. E acrescenta que o órgão está com “os pés e os olhos no futuro para melhor servir a seu único patrão, o povo do Estado do Rio de Janeiro”.

Então, por favor, avisem ao Presidente que o patrão dele quer de volta o serviço tão útil que lhe foi subtraído. E que suspender algo que funcionava perfeitamente é andar para trás e não combina com quem está com os pés e olhos no futuro.

B. Piropo