Sítio do Piropo B. Piropo |
< O Globo >
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01/08/2005
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< Revista íntima > |
O amigo tem viajado de avião ultimamente, especialmente em terras estrangeiras e mais particularmente na terra dos nossos grandes irmãos do Norte? Se tem, sabe que a coisa anda braba. Se não tem, agradeça por ter escapado de inspeções e revistas das mais vexaminosas. Dia desses eu mesmo vi confiscarem uma tesourinha de unhas de uma encanecida senhora que, por mais que chiasse, ficou sem sua arma hedionda, embora quanto mais eu imaginasse aquela simpática criatura rasgando a garganta do comandante com sua mortal tesourinha de unha mais me dava conta do ridículo da situação. Quanto a mim, já desisti de protestar. De meu velho e utilíssimo canivete suíço, fiel companheiro de muitas viagens, já me separei há muito. Ganhei outro recentemente, mas tenho resistido bravamente ao impulso de levá-lo comigo. Pois apesar dessa cara de velhote inofensivo, na hora do embarque me sinto um Rambo. Me fazem tirar os sapatos, abrir os braços e as pernas, sou cheirado e apalpado das formas menos sutis e sempre saio do perímetro de segurança agradecendo a Deus por, pelo menos até agora, haver escapado da revista íntima. O problema é sério. Nos aeroportos de grande movimento, especialmente nas ocasiões dos famosos alertas multicoloridos (já peguei amarelo e laranja e espero jamais encarar um vermelho) formam-se filas que nos horários de grande movimento pode chegar à centena de metros, nas quais se pode perder mais de uma hora apenas para atravessar a primeira inspeção de segurança. Isso quando não se é escolhido para nova revista na porta do avião – da qual, com minha cara de velhote inofensivo, raramente escapo. O problema ficou tão sério que as autoridades aeroportuárias norte americanas, com pesada ajuda da informática, começaram a tomar providências para contorná-lo. Por iniciativa da AAAE (American Association of Airport Executives, em < http://aaae.org/ >), diversos aeroportos americanos, em conjunto com as autoridades de segurança (DHS e TSA) implementaram um programa piloto denominado “Registered Traveler” que reúne dez mil voluntários em todos os EUA e que, se aprovado, será expandido para todo o território americano aos viajantes freqüentes que desejaram aderir A coisa funciona assim: quem desejar acelerar o embarque fornecerá dados que incluem nome, endereço, telefone, data de nascimento e outras tantas informações que serão submetidas ao escrutínio das agências de segurança e inteligência governamentais. Se considerado confiável, terá seus dados pessoais, incluindo impressões digitais e íris, cadastrados em um banco de dados nacional e adquirirá o status de “viajante registrado”, com direito a atendimento especial. Ao embarcar, suas impressões digitais e íris serão examinadas. Sendo identificado como viajante registrado, além de encarar uma fila menor, sua inspeção será menos rígida e estará isento da segunda revista na porta do avião O Aeroporto de Orlando, por sua vez, implementou um programa semelhante, denominado “Clear” (< http://flyclear.com/ >). Funciona apenas lá e é pago (o registro custa US$ 79,95 anuais, que segundo os responsáveis, servem apenas para cobrir os custos do programa), mas as regras são basicamente as mesmas. Se a moda pega – e tudo indica que vai pegar – em breve os Estados Unidos criarão duas classes de passageiros. Aqueles que decidiram trocar sua privacidade pelo conforto e resolveram submeter suas vidas ao escrutínio das autoridades de segurança para embarcarem um pouco mais depressa e o resto, que será submetido aos vexames de praxe. Resto este que certamente incluirá a nosotros, ciudadanos de Latinoamérica y alrededores, que além da pecha de prováveis imigrantes ilegais, teremos que carregar também a de terroristas em potencial. Do jeito que a coisa vai, na próxima viagem eu não escapo da revista íntima... B. Piropo |