Imagine que, daqui a alguns anos, você esteja na sala de espera do dentista, no restaurante aguardando seu pedido ou no metrô após um dia duro. Em suma: tem algum tempo de espera à sua frente e procura algo para preenchê-lo. O cavalheiro a seu lado, na mesma situação, pesca no bolso alguma coisa que se parece com uma folha de papel, desdobra-a até que fique do tamanho de uma página de jornal formato tablóide e começa a ler. A “coisa” é luminescente e tem o aspecto das telas de cristal líquido usadas nos micros portáteis. Você dá uma olhada de esguelha e percebe que ela exibe a página de um livro. Mas seu conteúdo não é estático: na medida que o cavalheiro prossegue a leitura, as páginas vão mudando. Subitamente o cavalheiro toca em algum ponto sensível da “coisa” e as páginas do livro são substituídas pelas do jornal do dia, com as últimas notícias que vão se sucedendo na tela.
Que diabo seria aquilo?
Aquilo é um dos sonhos tecnológicos do futuro: o “papel inteligente”. Um objeto que é ao mesmo tempo uma tela luminescente e um dispositivo permanentemente conectado (sem fio, naturalmente) á Internet do futuro, uma rede planetária que transferirá informações em altíssima taxa para praticamente todo tipo de dispositivo. O papel inteligente poderá exibir toda informação obtida nessa rede, desde texto de livros até conteúdo do jornal diário ou novelas da televisão, neste último caso com a ajuda de um minúsculo par de fones de ouvido também sem fio, naturalmente.
Se você acha que isto não é coisa para você, mas para seus netos, está enganado. Porque a tecnologia está quase toda disponível. Internet sem fio em alta taxa de transferência cobrindo grandes áreas já existe aqui mesmo no Brasil, seja usando tecnologia WiFi, como em Piraí, seja WiMax, como em Mangaratiba e Ouro Preto. Dispositivos quase microscópicos capazes de transmitir dados sem fio também já existem: são os chamados RFID (Radio Frequency IDentification), tanto ativos quanto passivos, só falta aperfeiçoá-los um pouco. A tecnologia para desenvolver telas flexíveis, o item aparentemente mais complicado, também já existe há mais de trinta anos, quando o cientista Chien Tang da Kodak descobriu a eletrofosforecência de compostos orgânicos que deu origem à fabricação das telas de LEDs orgânicos, os OLEDs, de baixíssimo consumo de energia que já equipam alguns dispositivos como telefones celulares e PDAs. Se você quer mais informações sobre o estágio de desenvolvimento dessas tecnologias, a Internet está aí para isso mesmo. Inclusive o Sítio do Piropo, em < www.bpiropo.com.br >, onde uma visita à seção Pesquisar seguida de buscas com os termos “OLED”, “RFID”, “WiMax” e “WiFi” levará a alguns artigos esclarecedores.
Mas leia novamente a descrição do dispositivo, veja as tecnologias listadas no parágrafo anterior e pense um pouco: não estaria faltando alguma coisa para transformar aquele sonho em realidade?
Se a palavra “bateria” assomou em sua mente, você é um sujeito perspicaz. Mas precisa ser mais bem informado, porque também este problema está em vias de ser resolvido. Mais especificamente pela NEC, que anunciou há duas semanas na edição deste ano do iExpo, evento anual que organiza em Tóquio, o desenvolvimento da ORB, de Organic Radical Battery, uma bateria cujo aspecto é de uma manta de menos de um terço de milímetro de espessura (300 micra, para ser exato), flexível, dobrável, com densidade de energia da ordem de 1 mWh/cm2 (um miliwatt hora por centímetro quadrado), não inflamável, não explosiva, isenta de compostos tóxicos como metais pesados (níquel, mercúrio, chumbo ou cádmio) e biodegradável por se tratar de um polímero orgânico. Uma bateria que, além de tudo isso, pode ser recarregada milhares de vezes e leva apenas meio minuto para receber 80% da carga total. Sim, eu sei que parece um sonho ou, no mínimo, “pegadinha” de primeiro de abril, mas nesta época do ano está mais para presente de Papai Noel. Se você duvida leia o “press-release” da NEC “NEC Develops New Ultra-Thin, Flexible, Rechargeable Battery Boasting Super-Fast Charging Capability - Organic radical battery is small enough to embed in smartcards and intelligent paper” em < www.nec.co.jp/press/en/0512/0701.html >.
A matéria prima de que são feitas as ORB é um radical de polímero orgânico, um tipo de material plástico que pode assumir um estado intermediário entre sólido e líquido (“electrolyte-permeate gel state”). A NEC vem pesquisando este polímero para a fabricação de baterias há pelo menos cinco anos, tendo anunciado em agosto passado um dispositivo constituído por quatro “folhas” de 5cm x 4cm de ORB com apenas quatro milímetros de espessura para ser usado como suprimento emergencial de energia em micros de mesa substituindo os “no breaks” (veja em < www.nec.co.jp/press/en/0508/0502.html >). Mas uma bateria tão fina e flexível para alimentar o “papel inteligente” é novidade absoluta.
O que me leva a constatar, um tanto assombrado, que o futuro está cada vez mais perto...
B. Piropo