O Globo
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26/07/1999
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Tangerina Sabor Maçã: Mac World New York 99 |
Piropo cobrindo MacWorld? Estranhou? Pois imagine eu... Logo no primeiro dia um membro da tribo das maçãs brandiu, orgulhoso, o argumento que a seu ver liquidaria a discussão: "o iMac é muito mais bonito que qualquer PC". E eu pensei: e daí? Micro é uma ferramenta. Eu mesmo jamais cogitei incluir o quesito "beleza" na escolha de um alicate. E foi a partir desse momento que comecei a me sentir assim meio que como um allien naquele MacWorld, se é que me faço entender. E percebi que estava imerso em outra cultura. Melhor dizendo: outra religião. Cujos dogmas não são fáceis de entender, exceto para os iniciados. Por exemplo: durante a feira, um respeitável jornalista especializado em Mac, justificando determinadas atitudes da Apple, lascou: "ao que parece, eles pensam que possuir um MacIntosh já é uma espécie de privilégio..." E foi imbuído deste espírito que esperei mais de uma hora em pé na fila para conseguir um lugar no fundo do auditório, juntamente com o resto da imprensa internacional, para ver de longe um animado Steve Jobbs proferir a "keynote speech", a palestra de abertura da MacWorld New York 99. Eu disse animado? Pois bota animado nisso. E não sem razão: afinal, ele voltou à Apple justamente para fazê-la retornar aos anos de glória, devolvendo-a a seu rumo original. E, ao que parece, está começando a conseguir. A menina dos olhos da Apple, o iMac, foi lançado há menos de um ano e já vendeu quase dois milhões de unidades. As tecnologias de ponta, abraçadas pela Apple e incorporadas aos seus polutos, estão decolando rapidamente: já há mais de cem diferentes dispositivos USB no mercado (e se espera que o número atinja a 250 nos próximos meses) e pululavam na feira dispositivos de armazenamento usando o novo barramento FireWire. Nos últimos doze meses, foram lançados ou atualizados nada menos que 4 mil novos softwares para a linha Mac. Portanto, razão para o entusiasmo de Jobs não faltava. Ele abriu a "keynote" exibindo alguns números para comprovar o sucesso da empresa depois que voltou a abraçar a estratégia de centralizar seus esforços no desenvolvimento de produtos criativos que incorporam tecnologia inovadora. Em seguida, mencionou o Mac OS9, o novo sistema operacional para Mac com lançamento previsto para outubro que, dentre suas mais de cinqüenta inovações, incorpora o Sherlock II, um poderosíssimo dispositivo de busca na Internet voltado para o comércio eletrônico (95% dos usuários de MacIntosh nos EUA estão plugados na Internet). Depois, demonstrou ao vivo o Quick Time TV, um sistema de distribuição de vídeo e áudio através da Internet que emprega o Quick Time (já na versão 4) para exibir via Internet vídeos de alta qualidade usando tecnologia de alto desempenho e que já conta com a adesão de nomes como FOX, HBO, Disney, ESPN e ABC news. E finalmente encerrou a primeira parte da palestra com uma impressionante demonstração do ViaVoice, o software de reconhecimento de voz da IBM na versão para Mac. Uma beleza. E foi então que começou o show, a parte mais esperada pela platéia: o lançamento da versão portátil do iMac, segundo Steve Jobs "um iMac para viagem". Um micro que só poderia se chamar (adivinhem?) iBook e que, nos EUA, já pode ser comprado por US$ 1599. Mas quem comprar agora somente o receberá em setembro, quando as primeiras unidades estarão disponíveis para o público. O iBook é uma máquina peculiar. A começar pelo design. O bichinho tem uma alça para carregar (coisa que todo notebook deveria ter) e não tem ferrolho: para fechar, basta encostar as duas abas, como alguns telefones celulares. E foi lançado em duas cores: azul e tangerina. O iBook é um notebook multimídia que incorpora uma CPU PowerPC G3 de 300 MHz e dispõe de 32Mb de memória RAM (que pode ser expandida até 160Mb) e 512K de cache L2. Suporta o barramento USB. Traz embutido um drive CD-ROM de 24x, um HD de (apenas) 3,2 Gb, um modem de 56K e suporte à rede. Um controlador gráfico ATI Rage Mobility AGP de 2x com 4Mb de memória de vídeo alimenta a tela de matriz ativa TFT de 12" padrão SVGA que suporta 16 milhões de cores em uma resolução de 800 x 600 pixels com uma imagem brilhante e nítida. A carga da bateria alcança inacreditáveis seis horas de duração graças ao que Jobs classificou como "o mais sofisticado sistema de gerenciamento de energia da história da Apple". E tem detalhes de "design" impressionatemente criativos, como o carregador de bateria, um objeto circular que encaixa diretamente na tomada e no qual o cabo se enrola como em um ioiô. Mas sua característica mais impressionante é a AirPort. AirPort é um revolucionário sistema de rede sem fio que pode interligar até dez iBooks simultaneamente, distantes até 50m da unidade base. O sistema foi desenvolvido em conjunto pela Apple e Lucent e consiste de uma estação base que se comunica com cartões tipo PCCard inseridos nos micros (as antenas estão incorporadas aos micros por padrão). A estação base é um dispositivo circular que lembra os discos voadores dos filmes classe B e contém um modem de 56K e uma porta Ethernet padrão IEEE 802.11b que suporta taxas de transferência de até 11Mb/s. Trata-se de uma solução ideal para escolas e pequenos negócios que poderão intercambiar dados e compartilhar uma única conexão à Internet. O sistema é opcional: cada cartão custará US$ 99 e a estação base US$ 299. Se o AirPort funcionar como a Apple espera, será o bastante para garantir o sucesso do iBook. Um sucesso que parece muito provável. Afinal, sob a mão firme de Jobs, a Apple voltou a fazer exatamente o que sabe fazer melhor que ninguém: desenvolver produtos inovativos que incorporam a última palavra em tecnologia de ponta e vendê-los para o mercado doméstico. Uma estratégia que ficou clara na entrevista coletiva dos diretores da Apple: ao ser perguntado se o lançamento dos novos produtos significavam que a Apple estava dando por perdida a batalha do mercado corporativo e voltando suas baterias para os usuários domésticos, Steve Jobs pensou um pouco, ensaiou uma resposta mais longa, mas logo a interrompeu encerrando o assunto com um seco "yes". B.Piropo |