Sítio do Piropo

B. Piropo

O Globo
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23/02/1998

Conexões: Nada Como Saber Usar o Tradicional Jeitinho Brasileiro


Você chega ao hotel no final de um estafante dia de labuta ou prazer, seja lá qual for o motivo de sua viagem. Está aflito para pôr em dia seu correio eletrônico. Desembainha o fulgurante notebook, desnuda as partes íntimas do modem, encaixa nele uma extremidade do cabo e carrega o programa de e-mail. Agora, para fazer sua conexão, só falta introduzir em seu devido lugar o conector da outra extremidade do cabo. Mas cadê o "devido lugar"? Onde esconderam a tomada da linha telefônica? Onde enfiar aquele conector, deus meu? E de repente você se vê sozinho em um quarto de hotel com um plugue na mão à procura de um buraco onde metê-lo. Uma situação, no mínimo, vexatória.

Se você estiver em um hotel decente, padrão primeiro mundo, não terá grandes dificuldades: com certeza achará uma tomada "J-11" ao alcance da mão. "J-11" é a designação usada para o tipo de conexão à linha telefônica padronizado nos Estados Unidos e que se está difundindo rapidamente por todo o mundo. O conector macho é uma peça de plástico de 1 cm de largura na qual há quatro contatos elétricos em uma face e um ressalto na outra para travá-lo quando encaixado na tomada. Você conhece: é o conector padrão encontrado em ambas as extremidades dos cabos fornecidos com os modems. Pela mesma razão a tomada J-11 fêmea é igualmente conhecida, já que todo modem tem pelo menos uma. Portanto, a primeira coisa a fazer é procurar por uma tomada destas. Em geral você a encontra na parede, nas vizinhanças do telefone. Se não estiver por lá, e se a mesa ou escrivaninha de trabalho que há em todo quarto de hotel que se preza não ficar próxima do telefone, procure em volta da mesa (não deixe de fazê-lo: uma vez eu desmontei meia instalação telefônica de um apartamento de hotel em Chicago para conectar meu modem e quando estava lendo as mensagens do correio eletrônico percebi junto à mesa, bem na minha frente, a tomada me encarando com um safadíssimo ar de superioridade primeiromundista que quase me mata de vergonha). E se não a encontrar em nenhuma das paredes, olhe atrás do aparelho telefônico: alguns hotéis preferem a tomada no próprio telefone por questões de segurança ou economia. Encontrando-a, enfie nela seu cabo e conecte-se.

E se não encontrar? Bem, neste caso você tem um problema. Mas não se preocupe: nada que não se resolva com algum engenho, arte e meia dúzia de traquitanas que você, precavido como é, há de sempre carregar em um dos compartimentos da maleta que transporta seu notebook.

A primeira, e que resolve nove problemas em dez, é o conector em "Y". Trata-se do equivalente telefônico do popular "benjamim" das tomadas elétricas: uma trapizonga que tem, de um lado, um conector J-11 (macho) e do outro duas tomadas J-11 (fêmeas). Se o telefone liga-se à rede através de um cabo com um conector J-11 encaixado em uma tomada no próprio aparelho, basta desencaixar o cabo da tomada do corpo do telefone, enfiar nela a extremidade "macho" do conector em "Y" e encaixar em suas tomadas fêmeas o cabo que vem da parede e o que vai para o modem. Você somente terá problemas se a tomada se situar na face inferior do telefone. Mas isto geralmente se resolve conjugando fé com tecnologia e conseguindo um vão livre sob o telefone para encaixar o conector apoiando o aparelho sobre a bíblia e o catálogo telefônico que se encontram em toda mesinha de cabeceira de hotel.

Já se o cabo não pode ser desencaixado do telefone (muitos hotéis usam este tipo para evitar a tentação de levar o aparelho telefônico como lembrança), verifique como é feita a ligação com a rede. Provavelmente você vai ter que afastar a cama e seguir o cabo até a caixa embutida na parede. Se lá houver uma tomada J-11, o problema está resolvido: desencaixe o cabo da tomada, enfie nela seu conector em "Y" e ligue, em suas duas tomadas fêmeas, os cabos do telefone e do modem. Uma observação: se houver pelo menos um conector J-11 em qualquer das extremidades do cabo que liga o telefone à parede, você sempre poderá conseguir sua conexão, mesmo sem o conector em "Y". Basta ligar o modem diretamente à linha, enfiando o conector J-11 no modem ou na tomada da parede, dependendo de onde estiver a conexão J-11. Mas neste caso ficará sem telefone, já que apenas o modem estará ligado à linha.

Se o hotel é aqui mesmo no patropi, você pode se deparar com uma situação relativamente comum: um aparelho telefônico sem tomada, cujo fio sai diretamente de suas entranhas e que na extremidade oposta é ligado á parede através da tomada padrão brasileira, uma trapizonga enorme com quatro contatos tipo faca, de tal forma desencontrados que somente pode ser encaixada em uma posição. Neste caso o problema se resolve com um adaptador encontrado em qualquer casa de material telefônico brasileira: um objeto que de um lado é uma tomada macho padrão brasileiro e do outro uma tomada fêmea J-11. Se você tiver sorte, talvez encontre um adaptador duplo, que funciona como "benjamim": na face inferior há uma tomada macho padrão brasileiro, na superior uma tomada fêmea do mesmo padrão e em uma das faces laterais uma tomada fêmea J-11. Se você tiver a sorte de conseguir um bicho destes, basta desencaixar o cabo do telefone da tomada da parede, enfiar nela o conversor e encaixar o cabo do telefone na tomada padrão brasileiro da face superior do conversor e o cabo do modem na tomada J-11 da face lateral (depois, ao deixar o hotel, cuidado para não esquecer seu conversor na tomada). Mas se você não conseguir um conversor duplo, o problema se resolve com o conversor simples: desencaixe o cabo do telefone da tomada da parede, encaixe nela o conversor e, no conversor, o cabo do modem. Você vai ficar sem telefone, mas conseguirá sua conexão.

O problema mais sério ocorre quando o cabo sai das entranhas do telefone e mergulha em um buraco na tampa da caixa embutida na parede. Sério, mas não insolúvel: basta uma pequena cirurgia telefônica. Com uma chave de fenda, remova a tampa da caixa e examine, em seu interior, a ligação dos fios do cabo telefônico à rede. Há uma boa probabilidade que eles estejam aparafusados a terminais . Se for assim, tudo se resolve com um cabo que você também pode encontrar nas boas casas de material telefônico: em uma extremidade ele tem um conector J-11 macho e da outra saem dois ou quatro fios terminados por contatos que podem ser aparafusados nos terminais da caixa. Basta afrouxar um pouco os parafusos que prendem os fios do cabo do telefone, encaixar os terminais de seu cabo nos mesmos contatos e apertar novamente os parafusos sem remover os fios do telefone: quando você encaixar o conector J-11 da outra extremidade do cabo em seu modem, poderá fazer sua conexão mantendo o telefone ativo. Se seu cabo tiver quatro fios, provavelmente usará as cores padronizadas amarelo, preto, verde e vermelho. Esqueça os dois primeiros, lembre-se da bandeira portuguesa e faça a conexão usando apenas os fios vermelho e verde.

Em alguns casos, a conexão entre os fios do cabo telefônico e os da rede, no interior da caixa, não é aparafusada, mas soldada. Ou os fios da rede e do cabo telefônico são apenas desencapados e enroscados uns aos outros dentro da caixa. Ou não há caixa alguma e o telefone é ligado a um cabo que corre pelo rodapé, com os fios simplesmente enroscados para garantir o contato elétrico e protegidos com fita isolante. Nestes casos, use dois pequenos pedaços de fio ou arame metálico (que pode ser obtido desencapando um trecho de alguns centímetros de comprimento de cabo telefônico tipo "par trançado") para prender firmemente os terminais dos fios verde e vermelho de seu cabo a ambos os fios do telefone, em um ponto onde não haja isolamento, e proteja sua "gambiarra" com fita isolante. Nos casos extremos, procure nos rodapés pelo cabo tipo "par trançado" da rede telefônica. Encontrando, com cuidado para não cortá-los, raspe com uma lâmina amolada um pedaço de cerca de 1 cm do revestimento isolante de cada fio do par trançado (faça isto de tal forma que os trechos desencapados fiquem "desencontrados", a alguns centímetros de distância) e com dois pedaços de fio metálico, enrole e prenda os terminais dos fios vermelho e verde de seu cabo aos trechos desencapados do par trançado. Depois, teste o telefone. Se funcionar, encaixe o conector J-11 de seu cabo ao modem e siga em frente.

Estas providências garantem a conexão, mas não o conforto: dependendo do comprimento dos cabos, você pode acabar trabalhando na cama com o notebook precariamente apoiado nos joelhos ou na mesinha de cabeceira. Para evitar isto, eu carrego uma extensão de dez metros de cabo telefônico com um conector macho J-11 em cada extremidade. E um segundo tipo de conector em "Y", com três tomadas J-11, todas fêmeas - que não somente serve para ligar dois dispositivos a um único cabo como também para simplesmente emendar dois cabos, aumentando ainda mais o comprimento da extensão. Com isto, trabalho confortavelmente com o notebook sobre a mesa seja lá qual for a distância entre ela e a tomada do telefone.

Eu, que por dever de ofício já me vi obrigado a fazer conexões em apartamentos de hotel em meio mundo, incluindo o interior do Brasil, tenho me saído garbosamente graças a um kit telefônico modesto mas eficiente composto de itens que podem ser encontrados em qualquer boa casa de material telefônico: um par de conectores em "Y" (um macho/fêmea, outro fêmea/fêmea), um cabo com fios e terminais em uma extremidade e um conector macho J-11 na outra, um conversor de tomada padrão brasileiro para J-11, um cabo de dez metros com conectores macho J-11 em ambas as extremidades, algum engenho e muita arte para combinar estes dispositivos nas configurações mais estranhas. Além de um par de pequenas chaves de parafusos (de fenda e phillips), um rolo de fita isolante, um pedaço de um ou dois metros de par trançado, uma lâmina retrátil e dois alicates (um de corte, um de bico), que podem ser achados em qualquer loja de ferragens e sempre me acompanham quando viajo.

Kit Piropo: Cabo com terminais,
adaptadores em Y macho e fêmea
e conversor padrão brasileiro

Kit Piropo

Kit Piropo: Cabo longo,
pedaço de fio tipo par trançado,
fita isolante e ferramentas

Kit Piropo

Taí a receita do kit Piropo. Com ele e alguma sorte, até agora tenho me dado muito bem.

No mais, são cuidados de ordem geral. Se o carregador de baterias de seu notebook não for do tipo "multivolt" (que detecta eletronicamente a tensão da linha de alimentação e se ajusta de acordo), antes de conectá-lo verifique se as tomadas de energia são 110 ou 220 volts. Se não for a exigida pelo seu notebook, peça um conversor na recepção: todo hotel que se preza põe alguns à disposição dos hóspedes. E por falar em tomada de energia: os padrões são tão diferentes que sempre é bom levar com você um conjunto de adaptadores universais que podem ser encontrados nas boas casas do ramo. Finalmente: antes de mandar o modem discar, ajuste a "string" de inicialização de acordo. Veja se o telefone do hotel disca "tom" ou "pulso" (se o pessoal da recepção não souber informar, simplesmente coloque o fone no ouvido e disque um número qualquer; se ouvir uma série de "cliques", é "pulso"; se ouvir uma espécie de nota musical, é "tom") e use o comando ATDP se for "pulso" ou ATDT se for "tom". Depois, verifique se é possível conseguir uma linha externa sem interferência da telefonista. Geralmente basta discar zero e aguardar o sinal externo de discar. Se isto ocorrer, acrescente um zero e uma ou duas vírgulas antes do número a ser discado: o zero pede o sinal de discar e cada vírgula adiciona uma espera de três segundos para aguardar o sinal. E, finalmente, se seu modem se recusar teimosamente a discar emitindo o aviso "NO DIALTONE" é porque não reconheceu como sinal de discar o ruído emitido pela mesa telefônica. Neste caso, inclua na string de inicialização o comando que instrui o modem para discar sem aguardar pelo sinal. Em geral o comando S6=10 funciona, mas como isto varia de modem para modem, procure no manual pelo comando correto para o seu.

E boas conexões.

B. Piropo