Há alguns meses eu publiquei aqui mesmo duas colunas sobre padrões Web, a < http://blogs.forumpcs.com.br/bpiropo/2011/02/15/3320/ > primeira delas descrevendo sucintamente o que são esses padrões, a < http://blogs.forumpcs.com.br/bpiropo/2011/02/20/a-guerra-dos-padroes-ii-o-vencedor-e/ > segunda discutindo sua evolução e tecendo algumas considerações sobre as tendências para o futuro próximo. Considerações que levaram a concluir que este futuro seria dominado por três tendências prevalecentes: a consolidação do emprego generalizado das “folhas de estilo” com a adoção do padrão CSS3, o abandono do padrão XHTML em favor do bom e velho HTML cuja versão HTML5 está praticamente implementada e a ampla adoção do JavaScript para o desenvolvimento de páginas da rede
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Figura 1: Logotipo oficial do HTML5 |
As colunas foram publicadas há mais de meio ano, e meio ano em termos de Internet é um tempo considerável. O suficiente para mostrar que o que então eram meras previsões, agora já toma ares de verdade estabelecida.
Mas isto, afinal, era esperado.
O que não era esperado – exceto, talvez, por alguns visionários – era um efeito colateral que vem se tornando cada vez mais óbvio: o uso daquelas mesmas três ferramentas de desenvolvimento web, HTML, CSS e JavaScript, para a criação de aplicativos não necessariamente voltados para a Internet, porém capazes de transitar sem alteração (ou recompilação) entre os principais sistemas operacionais ora em uso. E não apenas nos computadores convencionais como também em quase todo dispositivo portátil, desde “netbooks” e “notebooks” até telefones espertos e tabletes. E a tendência é que este tipo de aplicativo se dissemine cada vez mais. E rapidamente.
Pelo menos esta é a opinião de Rob Chandhok, presidente da Divisão de Serviços Internet da Qualcomm, expressa em < http://news.cnet.com/8301-1035_3-20104056-94/how-html5-may-become-the-standard-for-apps-inside-apps/?part=rss&subj=news&tag=2547-1_3-0-20&tag=nl.e703 > entrevista para Roger Cheng e publicada na CNet News.
Segundo ele, no próximo ano e meio a dois anos, o padrão HTML5 será amplamente adotado não apenas para gerar páginas da rede, mas também para o desenvolvimento de aplicativos genéricos. O que, aliás, e ainda segundo Chandhok, já está sendo feito por empresas como Pandora e LinkedIn.
E a razão disto é simples: aplicativos aderentes ao padrão HTML5 rodam igualmente bem em qualquer programa navegador que também obedeça ao padrão (e todas as versões mais recentes dos principais navegadores o fazem, variando apenas o grau de aderência) não importando em que sistema operacional o navegador esteja sendo executado.
Para avaliar o real significado disto basta pensar um pouco em um fenômeno cada vez mais comum ultimamente, consubstanciado pelos serviços em nuvem e aplicativos se conectando via Internet e buscando dados diretamente na rede: a plataforma PC está se encaminhando decididamente para aplicativos baseados em navegadores e deixando cada vez mais de lado as chamadas aplicações “nativas” da plataforma. O resultado é que um aplicativo concebido para rodar, digamos, sob o Firefox em um poderosíssimo PC de mesa, irá rodar igualmente bem no sumário (porém aderente ao HTML5) navegador Android Flash Lite, “embutido” no sistema operacional Android que equipa um telefone esperto de última geração de baixíssimo poder de processamento. E sem precisar de qualquer modificação.
É claro que isto tem alguns efeitos colaterais inesperados e, por alguns, indesejados. Pois se roda no Firefox 6 e no IE9, rodará igualmente bem no Safari 5, o navegador preferido pelos usuários da Apple. E trará um desdobramento interessante: os desenvolvedores passarão a se aproveitar disto para criar programas aderentes aos padrões web HTML5 e CSS3 que rodarão perfeitamente nos produtos Apple sem jamais submetê-los ao crivo da empresa e muito menos vendê-los nas famosas Apple Store – embolsando legalmente o quinhão que a Apple costuma subtrair do lucro daqueles que desenvolvem aplicativos para seus produtos.
Hoje, com a consolidação dos padrões e sua indiscutível disseminação (o que implica aprovação da comunidade de desenvolvedores), as empresas envolvidas no desenvolvimento de aplicativos estão começando a se movimentar na direção de facilitar a vida daqueles que pretendem criar páginas (e, naturalmente, aplicativos) baseados no tripé HTML5 / CSS3 / JavaScript. E até mesmo a poderosa Adobe “botou a mão na massa” e criou um programaço especialmente devotado a este fim.
E olhe que a Adobe é a “dona” do Flash, portanto teoricamente seria a maior prejudicada com a adoção do HTML5 [para quem não sabe a razão disto e não está disposto a consultar as colunas citadas no primeiro parágrafo: Flash é um aplicativo originalmente da Macromedia, depois adquirido pela Adobe, usado quase universalmente para desenvolver animações, jogos, vídeo via Internet (“streaming”) e que roda em qualquer programa navegador que permita a instalação do programa auxiliar (“plug-in”) gratuito denominado “Flash Player”. E os novos padrões, notadamente a combinação judiciosa de certas funções do HTML5 com o JavaScript, permitem fazer quase tudo o que se faz com o Flash sem o uso de qualquer programa externo e sem a instalação de programas auxiliares, usando exclusivamente os recursos dos próprios padrões; ou seja, a dupla HTML5/JavaScript concorre diretamente com o Flash].
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Figura 2: O logotipo do Edge da Adobe |
O aplicativo da Adobe chama-se Edge. Uma versão preliminar já está disponível no sítio < http://labs.adobe.com/ > Adobe Labs e espera-se uma versão final, no mercado, já no próximo ano. O Edge é um aplicativo da Adobe que faculta ao desenvolvedor o uso dos recursos dos novos padrões para criar praticamente os mesmos efeitos que poderia criar com o Flash. O que, embora pareça um contrassenso (afinal, o Flash ainda é um dos melhores produtos do mercado e brilha entre os aplicativos da CS5, o formidável pacote de aplicativos da própria Adobe) não passa da mera aplicação do senso comum: não adianta brigar com as tendências do mercado.
Como resultado disto o Flash – que continuará sendo comercializado, já que se trata de um formidável produto para criação de animações – será aperfeiçoado para a criação de aplicativos em três áreas importantes: jogos, vídeo via Internet e aplicativos de negócios, enquanto o resto, principalmente animações destinadas a rodar em dispositivos de menor poder de processamento como tabletes, micros portáteis e telefones espertos, será desenvolvido usando exclusivamente os recursos dos novos padrões com a ajuda do Edge.
E não é só a Adobe que se prepara para o inevitável. A Microsoft também. Basta atentar para a confusão que se formou após a apresentação de uma versão demo de Windows 8 feita por Julie Larson-Green, Vice-Presidente da Microsoft, no evento < http://allthingsd.com/category/d/d9/ > “D9 Conference” realizado no início de junho na Califórnia. A razão da celeuma foi o fato de Julie ter mencionado textualmente a frase "this application is written with our new developer platform, which is based on HTML5 and JavaScript." (este aplicativo foi desenvolvido com nossa nova plataforma para desenvolvedores, baseada em HTML5 e JavaScript).
[Para quem se interessar: o vídeo completo pode ser encontrado em artigo de Ina Fried < http://allthingsd.com/20110601/microsofts-windows-8-demo-from-d9-video/ > “Microsoft’s Windows 8 Demo From D9 (Video)” e o comentário de Julie é feito pouco antes do quarto minuto da apresentação; mas eu sugiro que todo o vídeo seja assistido com atenção pois, embora pouco tenha a ver com o tema desta coluna exceto pela frase de Julie que gerou tanta polêmica, dá uma boa visão das intenções da MS no que toca à futura interface com o usuário de Windows 8].
Uma frase que, como seria de esperar, deixou de cabelo em pé os atuais desenvolvedores para Windows, mestres nas interfaces visuais de programação Visual Studio com seu suporte para Visual Basic, C#, ponto-NET, Silverlight e coisas que tais. Afinal, comparado com este arsenal, o poder de fogo do novo padrão HTML5 é quase desprezível e, segundo a interpretação de alguns, Julie havia mencionado que tudo isto seria substituído por ferramentas HRML5 e JavaScript. A turma só sossegou depois que o assunto se esclareceu e percebeu-se que a MS não pretende que os desenvolvedores troquem suas poderosas e tradicionais ferramentas de desenvolvimento de aplicativos por aquelas baseadas nos novos padrões, mas apenas que acrescentem a seu arsenal algumas novas armas.
Seja lá como for, tudo indica que a tríade HTML5 / CSS3 / JavaScript já “pegou”. E “pegou” firme.
É só aguardar um pouco até que se popularize e a comunidade de desenvolvedores comece a se integrar definitivamente a ela.
Então veremos cada vez menos aplicativos “nativos” puros e cada vez mais uma mistura deles com outros criados com a ajuda dos novos instrumentos concebidos para desenvolvimento web.
É esperar para ver...