< Coluna em Fórum PCs >
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03/08/2009
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< Nova Estrutura da Marca Intel V: a malfadada Netburst > |
Vocês, amigos leitores, nada têm a ver com minhas vicissitudes e descaminhos. Mas o respeito e atenção que lhes dedico me leva a justificar duas aparentes descortesias: o atraso na publicação desta coluna – particularmente deplorável por se tratar de uma série – e a ausência de respostas minhas aos comentários da coluna anterior. Asseguro que não se tratou de negligência ou descaso de minha parte, mas de impossibilidade devido a dificuldades de acesso à Internet. Ocorre que, por razões de trabalho, fui levado a me ausentar do Brasil por um período que, segundo o planejamento inicial, seria de uma semana mas, por força das circunstâncias, foi estendido para duas. Passadas em um país da África cujo nome me absterei de declinar mas que, ao que tudo indica, foi devidamente cheirado por um gigantesco felino que, com justa razão, o cobriu de areia – confirmando o ditado popular que afirma que há coisas que “se um gato cheirar, cobre de areia”. Internet, por lá, até que havia, porém intermitente e lenta, mal permitindo dar atenção ao correio eletrônico. E o trabalho árduo roubava todo o tempo. Além do que a maior parte da viagem foi feita pela TAP, uma experiência única e inolvidável. Inolvidável porque será impossível esquecer a espera de quase uma hora em pé no interior de um ônibus estacionado ao sol de verão no aeroporto de Lisboa apreciando a equipe de limpeza remover o lixo do interior da aeronave, a milimétrica distância entre as poltronas que tornou uma viagem de dez horas um extenuante suplício, o serviço de quinta categoria e por aí vai. E única porque jamais será repetida (atenção, não confundir TAP com Portugal: Lisboa é um jardim, o povo é delicado e atencioso, o tratamento que lá recebi no dia que lá passei em meu caminho de volta foi digno de um príncipe e guardo lembranças inolvidáveis – essas, no melhor dos sentidos – do país que, ao que parece, de ruim só tem mesmo a TAP). Isto posto, desculpas pedidas e falhas justificadas, vamos adiante. Como vimos na coluna anterior, o Pentium III foi o último representante do que poderíamos chamar de “primeira fase” da arquitetura P6 (quem não entendeu isto de “primeira fase”, sugiro a releitura da coluna anterior). Sua terceira revisão (ou subarquitetura, codinome “Tualatin”) incluía uma linha de montagem (“pipeline”) de dez estágios e, na versão comercial mais rápida de 1,4 GHz, um cache L1 de 512 KB em um núcleo com camada de silício com espessura de 130nm. Um bom processador, mas era 2002 e o mercado queria mais. “Mais”, naquele tempo, só podia ser conseguido aplicando força bruta. E força bruta, no caso, significava aumento da frequência de operação. Mas a Intel resolveu acrescentar, além disso, uma mudança de arquitetura que incluiu alguns aperfeiçoamentos adicionais que melhoraram bastante o desempenho do chip. E assim nasceu a arquitetura “Netburst”. Sua principal novidade foi o aumento significativo do número de estágios da linha de montagem, que a Intel batizou de “Hyper Pipelined Technology”: a primeira revisão, conhecida como “Northwood”, incluía uma “pipeline” de vinte estágios (a revisão final chegou a 31 estágios; mas dissipava tanto calor que, em uma alusão a seu codinome Prescott, foi apelidada de “press hot” pelas más línguas; logo voltaremos a falar sobre os problemas de dissipação de calor da arquitetura Netburst). Mas uma linha de montagem mais longa tem suas desvantagens: quanto maior o número de estágios, há mais instruções percorrendo a linha e será maior o recuo nos casos em que a predição de ramo tomou o ramo errado e obrigou o descarte de operações já realizadas. Para minimizar estes retardos a Intel incluiu no processador um “mecanismo de execução rápida” (Rapid Execution Engine) que permitia que a unidade aritmética e lógica da UCP operasse com o dobro da frequência do processador. E, finalmente, ainda visando aumentar a rapidez, a arquitetura Netburst adotou a tecnologia denominada “Execution Trace Cache”, que armazenava em cache as últimas micro-operações decodificadas de modo serem usadas imediatamente caso as próximas instruções dependessem delas (se tudo isso lhe pareceu difícil de entender, simplesmente ignore; tem a ver com características internas de microprocessadores que só estão ao alcance de iniciados). Neste ponto, um parêntese: eu sei que, para quem prometeu na primeira coluna evitar descer a detalhes técnicos, o parágrafo acima é indesculpável. Mas os leigos hão de me perdoar, pois na medida que a tecnologia evolui, as diferenças entre arquiteturas envolvem cada vez mais minúcias e detalhes cuja compreensão exige algum conhecimento técnico. Mas, para quem está apenas interessado na evolução da nomenclatura e no cipoal de marcas e nomes que se tornou a família de processadores Intel, os detalhes acima são irrelevantes. A estes, sugiro levar em conta apenas dois fatos. O primeiro é que as diferenças internas entre os processadores Netburst e P6 foram de tal ordem que justificaram considerar a primeira uma nova arquitetura. E o segundo, que é o que efetivamente nos interessa, é que esta nova arquitetura consumia muito mais potência que a anterior e, por via de consequência, dissipava muito mais calor.
No que toca aos nomes, assunto principal desta série de colunas, a mudança de arquitetura foi assinalada pela Intel de forma sutil: o primeiro processador a adotar a arquitetura Netburst (o de codinome Willamette) foi denominado Pentium 4, abandonando a numeração em algarismos romanos e adotando uma nova, em algarismos arábicos. Que, no entanto, morreu por aqui mesmo, pois nunca houve um Pentium 5. Os sucessores do Pentium 4 foram o Pentium 4 HT (de Hyper Threading, uma tecnologia que fazia com que, em certos casos especiais, cada linha de montagem pudesse operar por si mesma como se fosse um núcleo independente, a precursora da tecnologia de múltiplos núcleos), o Xeon (uma evolução do seu antecessor que adotava a arquitetura Netburst e destinada a uso em servidores), o Pentium D (cujo “D” nada tinha a ver com “Dual core” mas sim com “Desktop”, como veremos em um momento) e, finalmente, o Celeron D, para uso em micros de mesa no mercado de processadores de baixo custo e que na verdade não passava de um Pentium D com cache L1 significativamente menor. Neste ponto, e dadas as controvérsias que o nome “Pentium D” costuma suscitar, cabe uma explicação mais detalhada. Este processador tinha por objetivo ser usado em micros de mesa, ou “Desktops”. Daí o uso do “D”, contrapondo-se ao “M” do Pentium M, que se referia ao fato de que estes eram destinados ao uso em computadores móveis.
Ocorre que ambos conviveram um bom tempo no mercado. Ora, a existência simultânea de um Pentium D para micros de mesa e de um Pentium M para portáteis naturalmente levava o usuário a supor que se tratavam essencialmente do mesmo processador, com pequenas alterações internas que o otimizavam seja para o uso em micros de mesa, seja para o uso em micros móveis. Infelizmente nada podia ser menos verdadeiro. Na verdade eram processadores totalmente distintos, adotando arquiteturas diferentes e com marcantes diferenças em suas características, sobretudo no que toca ao consumo de energia: enquanto o Pentium D adotava a subarquitetura Prescott, a mais poderosa das revisões da arquitetura Netburst, o Pentium M ressuscitou a arquitetura P6 em sua revisão mais avançada, codinome Banian. Seria isso um retrocesso? Do ponto de vista de arquitetura, inegavelmente sim: pelas suas características, a Netburst era mais moderna e eficiente que a P6. Mas do ponto de vista da dissipação de calor e consumo de potência, que era o que interessava para os micros móveis, definitivamente não: a velha P6, revista e melhorada nas revisões (ou subarquiteturas) Banian e, mais tarde, Dothan, ambas usadas no Pentium M, era muitíssimo mais eficiente no gerenciamento de energia. Por tudo isto, não creio que nenhum engenheiro da Intel considere a arquitetura Netburst como um grande marco na evolução dos microprocessadores. Ao contrário, penso que a maioria deles considera realmente que se tratou de um mau passo. Ou, ao menos, de um passo certo, porém dado na hora e direção erradas. Seu membro mais poderoso, o Pentium 4 baseado na subarquitetura (ou revisão) Prescott lançado em 2004 chegou a ser fornecido para operar em 3,8 GHz (compare com os 1,4GHz do mais rápido dos Pentium III e entenda o que eu quis dizer lá em cima com “força bruta”) e incluiu diversas melhorias em relação aos modelos anteriores, como um mecanismo de predição de ramo mais eficiente e inclusão de novas instruções SIMD (o que foi denominado pela Intel de SSE3). Mas, definitivamente, não primava pela economia de energia. Ora, seu lançamento ocorreu justamente na época em que o mercado exigia micros portáteis cada vez mais poderosos, leves, bonitos e, sobretudo, com duração de carga da bateria cada vez mais longa. E tendências de mercado não podem ser ignoradas. O primeiro passo da Intel para satisfazer a esta demanda foi o retorno à arquitetura P6 já comentado na coluna anterior, com o lançamento do Pentium M, de “Mobile” (sim, esta foi a razão pela qual os Pentium fabricados a partir de então, ainda usando a arquitetura Netburst, passassem a receber a denominação de Pentium D, de “Desktop”). O segundo foi abandonar a arquitetura Netburst e desenvolver a Core. Mas isso, diferentemente do que prometi na coluna anterior, vai ter que ficar para a próxima. Que, para compensar, será postada mais breve do que de costume. Até lá. B. Piropo |