Acho que me meti em um beco sem saída...
Há duas semanas escrevi uma coluna sobre a “Sidebar” de Windows Vista porque, sendo o Vista a futura versão de Windows para micros de mesa, achei que o tópico poderia despertar o interesse dos usuários de uma das versões disponíveis de Windows que desconhecem como será a próxima pois, ao contrário do que a Microsoft costumava fazer com as versões “beta” de seus sistemas operacionais (sempre oferecidas ao público em geral), a do Vista está ao alcance apenas de um número limitado de usuários. Por isso imaginei que os demais, aqueles que estão cogitando sobre a conveniência ou não de migrar para o Vista após seu lançamento, poderiam estar curiosos sobre seus detalhes. A eles a coluna deveria interessar. E isto me motivou a escrevê-la.
Em menos de uma semana a coluna provocou 42 comentários. Poucos provenientes destes usuários. A maioria, pelo que pude perceber, provinha de usuários Linux, que não gostaram do fato de eu ter escrito sobre um assunto que não lhes interessa, quase todas criticando a “Sidebar” e, entre outras tantas manifestações de desagrado, taxando-a de inútil (esquecendo-se que seu uso – como o de Windows e a própria leitura da coluna – não é obrigatório, portanto quem não gostar ou achar inútil pode simplesmente deixá-la de lado). Um deles, o único que respondi por ser pertinente ao assunto da coluna, me aconselhava a escrever “artigos mais úteis”. E note que, na supracitada coluna, jamais me referi ao sistema Linux nem louvei as eventuais virtudes de Windows. Apenas descrevi a sidebar.
Mas, já que a utilidade do artigo foi questionada, decidi explicar as razões que me levaram a abordar aquele tema. Afinal, teria o artigo sido “útil” ou não? Pois a utilidade de alguma coisa é bastante relativa. Depende tanto das circunstâncias quanto do ponto de vista de cada um. Por exemplo: o comentário que questionava a utilidade da coluna foi assinado com um “nickname” que não me permite saber o gênero da pessoa que o postou. Presumindo que seja feminino e que estivesse sofrendo uma grave crise de tensão pré-menstrual, como deixam entrever os termos em que o comentário foi vazado, uma caixa de absorventes íntimos femininos poderia ser de grande utilidade para a referida pessoa nos próximos dias. Já se porventura se tratasse de um representante do gênero masculino, e nesse caso os termos do comentário talvez possam ser atribuídos a uma mera crise de mau humor, a mesma caixa de absorventes não lhe teria qualquer serventia. Portanto, como se vê, o conceito do que é ou deixa de ser útil não somente é relativo como também é bastante subjetivo.
Sobre a coluna “A sidebar de Vista” pode-se fazer consideração análoga: para quem usa Linux em qualquer um de seus sabores ou distribuições, odeia Windows sob todas as suas formas e manifestações e jamais conspurcaria sua sagrada máquina com um exemplar deste execrável sistema operacional, a coluna de fato não tinha utilidade alguma e nesse caso poderia simplesmente ter sido ignorada sem merecer comentários. Já para quem usa Windows, pretende usar Vista e gostaria de saber detalhes do novo sistema, a coluna informando sobre a sidebar bem que poderia ser útil e a leitura interessante. É simples assim.
Mas concordo que caberia um questionamento: seria o número de usuários de Windows que têm acesso ao FórumPCs suficientemente grande para justificar a “utilidade” de uma coluna sobre a sidebar de Vista? A julgar pelas únicas estatísticas que eu dispunha, sim. Eles provavelmente representam a maioria dos visitantes deste Fórum, portanto a coluna deveria apresentar algum interesse para eles. Resolvi então abordar esta questão na coluna seguinte, “Tendências”. Seu objetivo, ao levantar as porcentagens de usuários de Windows e outros sistemas operacionais, era apenas tornar claro que, sendo maior o número de usuários de Windows que de outros sistemas, a coluna seria de interesse para um número significativo de visitantes, portanto seria útil. Só isso. A coluna não apresenta qualquer opinião sobre as excelências e desvantagens do Linux ou de Windows, não compara suas qualidades ou defeitos, não faz qualquer comentário de natureza qualitativa, apenas quantitativa: constata que mais gente usa Windows que outros sistemas, portanto conclui que a coluna poderia ser de interesse para um grupo razoável de membros do Fórum. Mais nada. Apenas e tão somente isso.
Pra quê...
Os usuários de Linux, aos quais não agrada o fato de serem minoria (parecem considerar que isto se deve a artes do diabo, injustiça do destino, a desígnios insondáveis de colunistas mal-intencionados ou simplesmente a um castigo de Deus que não tem sido justo com eles e não percebe como são virtuosos, honrados e prenhes de boas intenções) se sentiram profundamente ofendidos e reagiram com sua, digamos, ênfase habitual. Os defensores de Windows, por sua vez, contra-atacaram com igual fúria. Resultado: em menos de uma semana a coluna recebeu 120 comentários, a maioria deles de usuários Linux esculhambando Windows ou de usuários Windows esculhambando Linux. Todos inteiramente alienados do tema central da coluna que pretendia apenas levantar as tendências de uso e não avaliar a qualidade de qualquer sistema operacional. Virou bate-boca, e nem sempre vazado em termos elegantes.
Como não dá para responder a mais de cem comentários – mesmo porque a maioria deles expressa apenas as preferências pessoais de seus signatários e gosto não se discute – me senti na obrigação de escrever mais uma coluna, esta que você está se dando ao trabalho de ler agora, para abordar aqueles que me pareceram pertinentes.
Pois então vamos a ela. Esperando, com fé, que a misericórdia divina permita que ela seja a última dedicada a este tipo de questão.
Mas antes vamos restringir seus horizontes.
Não pretendo responder, seja concordando seja contestando, os comentários que alegam ser Windows melhor que Linux ou Linux melhor que Windows. Da mesma forma que não responderia a comentários que argumentam ser Jeovah, Jesus ou Allah o mais poderoso e o verdadeiro Deus. Ou os que defendem ser o Flamengo melhor que o Vasco ou o Corinthians melhor que o São Paulo. Tempo, para mim, é um recurso precioso e escasso e eu não iria desperdiçar o pouco que me resta discutindo questões de fé, simpatia ou preferências pessoais, onde a emoção se superpõe à razão.
Mesmo porque na verdade não faz a menor diferença. Se você acredita em um Deus e professa uma religião, se pauta sua vida pelos princípios pregados por Ele e se isto lhe torna uma pessoa plena fazendo-o levar uma vida reta e íntegra, o objetivo da religião foi alcançado pouco importando qual seja esta religião ou este Deus. Se você “torce” por um time de futebol e isto faz com que você se sinta integrante de um grupo (ou, como agora é moda, de uma “nação”), se as eventuais vitórias e derrotas de “seu” time lhe dão as alegrias e emoções esperadas, você é um homem realizado pouco importando qual seja este time. E, finalmente, se você usa um determinado sistema operacional e este sistema roda os programas que você precisa em condições que lhes são satisfatórias, você tem tudo o que necessita de um sistema operacional, pouco importando qual seja este sistema. Não sou eu, por mais convincente que venha a ser, que lhe levarei a mudar de religião, de time ou de sistema operacional.
Resumindo: damos por certo e garantido que “seu” Deus é o mais poderoso e verdadeiro, “seu” time é indiscutivelmente o melhor e “seu” sistema operacional é inquestionavelmente superior seja lá quais forem. Você acredita que assim é e isto é o que basta para mim. Minha opinião, favorável ou contrária, não irá alterar a sua, que foi baseada em preferências pessoais, em fé, em empatia, em suma, em fatores sobre os quais pesa muito mais a emoção que a razão. Discutir essas preferências quase sempre resulta em guerra, como no Oriente Médio, morte, como nos enfrentamentos entre torcidas organizadas, ou troca estéril de mensagens, algumas agressivas e grosseiras, como na contenda entre tribos que usam diferentes sistemas operacionais. Não contem comigo para participar de nenhuma delas.
Portanto tais comentários não serão discutidos. Deixo para os que se divertem com este tipo de coisa a oportunidade de continuar debatendo o assunto e espero que breve o número de comentários tentando convencer aos “inimigos” que “seu” sistema operacional é o melhor tenha atingido a casa do milhar. Como não pretendo lê-los, solicito aos contendores que me avisem caso alcancem um consenso, ou seja, caso se consubstancie a improvável eventualidade de que um grupo consiga de fato convencer o outro que “seu” sistema operacional é realmente o melhor. Não creio que isto venha a ocorrer ainda durante os poucos anos que me restam de vida mas, se assim for, não gostaria de perder a oportunidade de me juntar ao grupo vencedor para comemorarmos a efeméride. Porém, enquanto o consenso não for estabelecido, peço aos amigos que, misericordiosamente, preservem minha ignorância sobre os rumos do debate.
Não discutirei também os comentários que tratam com desprezo os usuários “do outro” sistema operacional, não importando qual seja, considerando-os pessoas inferiores, desprovidas de senso comum, desinformadas ou ignorantes. Mesmo porque faço parte deste último grupo já que, ainda que não tenha a justa medida de minha ignorância, tenho certeza que é imensa. O que não me desanima: consciente dela, tento vencê-la pelo cansaço aprendendo uma coisa aqui e outra ali e compartilhando com meus colegas ignorantes o pouco conhecimento que vou assim adquirindo. Ao contrário de alguns donos da verdade, que se consideram detentores do conhecimento universal, sei que jamais conseguirei vencê-la: a soma dos meus conhecimentos será sempre inferior ao tamanho de minha ignorância. Mas continuo tentando, em um esforço semelhante ao do Quincas Berro d’Água, comovente personagem de Jorge Amado, que dizia: “Sei que não dá para conquistar todas as mulheres do mundo, mas deve-se fazer um esforço” (Quincas era um bandalho e não usou o termo “conquistar”, mas este é um Fórum de respeito e eu me dou o direito de adaptar a citação ao contexto). Mesmo porque considero a ignorância uma bênção. Não fosse ela, onde o prazer de aprender?
Também, evidentemente, me absterei de discutir se Windows é “melhor” ou “pior” que Linux nos termos em que a questão tem sido discutida neste Fórum. Quero apenas deixar claro que acredito que ambos, apesar de seus defeitos, funcionam perfeitamente, atendem às expectativas de seus respectivos usuários e, tanto um quanto o outro, são obras de uma notável complexidade dignas da mais profunda admiração. Nunca deixei de me maravilhar com o fato de funcionarem razoavelmente bem em computadores tão diferentes entre si como os que integram a chamada “linha PC”, ao contrário do Mac OS, por exemplo, desenvolvido para uma linha de computadores cujos exemplares, mesmo de distintos modelos, compartilham de muitas semelhanças e aderem perfeitamente a um único padrão já que são todos manufaturados pelo mesmo fabricante (o que não quer dizer que o Mac OS é inferior aos demais, apenas que roda em micros mais homogêneos; pelamordedeus não me metam em outra polêmica besta). Em suma: tanto os desenvolvedores de um quanto de outro merecem de minha parte um respeito que beira a veneração. Respeito que se estende a todos os membros de ambas as legiões de usuários, inclusive àqueles que não tem me retribuído com o mesmo respeito em alguns comentários postados nas colunas anteriores mas que, não obstante, contam com minha compreensão pois, como veremos adiante, sei como é duro tentar contrariar tendências.
Não vou discutir também a insinuação (única, felizmente) que eu estaria defendendo “alguma empresa que me paga alguma coisa”. E, me desculpem os que não me conhecem, mas não me darei sequer ao trabalho de explicar porque. Não vale a pena.
Mas se não vou abordar qualquer destes aspectos, que diabos pretendo discutir nesta coluna?
Bem, vou discutir os comentários que considero pertinentes ao tema, a saber os que afirmam que:
1) Existe uma grande variedade de assuntos que podem ser escolhidos para as colunas e elas não deveriam se limitar a discutir produtos. E as solicitações de alguns usuários para que sejam escritas colunas sobre outros temas, inclusive sobre produtos do “mundo livre” não devem ser desconsideradas.
2) O sítio de onde eu obtive as estatísticas é “de pouco acesso e relativamente restrito”, levando a crer que suas estatísticas não seriam confiáveis.
3) Na coluna “Tendências” os gráficos mostram que a porcentagem de usuários de Windows vem diminuindo e a de outros sistemas vem aumentando e eu não mencionei isto no texto.
E, finalmente:
4) O fato de “todo o mundo usar Windows” não tem a menor importância e não deveria ser levado em conta na escolha de temas para colunas.
Pois então vamos a eles.
1) De fato existe uma grande variedade de assuntos que podem ser escolhidos para as colunas e elas não deveriam se limitar a discutir “produtos”. Mas uma discussão sobre um ou outro produto sempre pode interessar a quem os usa. Principalmente quando este produto é um sistema operacional, que TODOS são obrigados a usar (ATENÇÃO: não quero dizer com isso que todos devem usar WINDOWS, estou apenas afirmando com absoluta convicção que todos devem usar UM sistema operacional, qualquer um). Logo, não acho que uma coluna abordando um aspecto particular (no caso a “sidebar”) de um sistema operacional seja perfunctória (desculpem os que não entenderam, mas como diz o João Ubaldo, a palavra existe e eu a uso), ainda mais em se tratando de um sistema operacional que está em versão beta e sobre o qual muita gente tem manifestado curiosidade. Mas concordo plenamente que as solicitações de alguns usuários para que sejam escritas colunas sobre outros temas, inclusive sobre produtos do “mundo livre”, não devem ser desconsideradas. Talvez quem fez este comentário não tenha notado, mas eu não sou um “colunista Windows”. Escrevo também sobre outros temas e só não escrevo sobre produtos do “mundo livre” porque me falta competência para tal, já que por não ser um usuário desses produtos careço de experiência ou conhecimento suficientes para escrever sobre eles. Mas quem estiver disposto a tanto saiba desde já que conta com meu apoio e incentivo – se é que isto representa alguma coisa – e seguramente, se o fizer, não terá o dissabor de ler um comentário meu afirmando que deveria ter escolhido outro assunto.
2) O sítio onde eu obtive as estatísticas é o < http://www.w3schools.com/ > W3 Schools. Em janeiro de 2006 (últimos dados publicados) ele recebeu cinco milhões e meio de visitantes únicos que efetuaram perto de cinqüenta milhões de “page views”. Destes, pouco mais da metade efetuaram suas visitas a partir dos EUA. O restante se distribui principalmente por 23 países, inclusive o Brasil, com 1,2% de visitantes (estas estatísticas estão em sua seção < http://www.w3schools.com/about/about_pagehits.asp > “About Page Views”). O fato do autor do comentário desconhecê-lo não significa necessariamente que o sítio seja “de pouco acesso e relativamente restrito”. Significa apenas que ele o ignora. Ignorância, como se sabe, não é pecado. Mas tecer afirmações taxativas baseado nela, é.
As estatísticas que usei na coluna “Tendências” (e que voltarei a usar nesta) foram estabelecidas pelo W3 Schools anotando, a cada acesso, o sistema operacional que seus milhões de visitantes usaram. Correspondem, portanto, a uma amostra composta por cinco milhões e meio de internautas. Se ela não for considerada representativa do universo de usuários de micros, estou inteiramente aberto a adotar quaisquer outras estatísticas que me forem indicadas para delas tentar extrair tendências, desde que utilizem uma amostra de tamanho igual ou superior e seja igualmente confiável (o sítio W3 Schools não tem vínculo algum com qualquer empresa desenvolvedora de sistemas operacionais ou programas navegadores; a quem não o conhece e está interessado na tecnologia usada para o desenvolvimento de páginas da Internet, recomendo veementemente uma visita; garanto que vale a pena). Até lá, continuarei usando as do W3 Schools por serem as únicas que disponho e por confiar nelas.
Portanto, quanto às estatísticas, estamos entendidos.
3) Estabelecida (ao menos, espero) a representatividade e a confiabilidade da fonte, vamos ao próximo ponto, o que questiona o fato de eu não haver mencionado a tendência decrescente da porcentagem dos usuários Windows e a tendência crescente da porcentagem dos usuários de outros sistemas.
É verdade. Não o fiz porque desejava apenas enfatizar que hoje o número de usuários Windows (e, portanto, dos membros do Fórum potencialmente interessados na coluna sobre a “sidebar”) é significativamente maior que o de usuários de outros sistemas. Mas, admito, os números mostram que a tendência é de que a legião de usuários Windows se reduza e de que a de usuários Linux cresça. O que fica ainda mais evidente se estendermos o período de observações aos últimos quatro anos e meio (total dos dados disponíveis na < http://www.w3schools.com/browsers/browsers_stats.asp > seção Browser Statistics do sítio W3 School).
Veja como isto fica claro na Figura abaixo onde aparecem as curvas de variação das porcentagens de usuários de Linux (apenas eles, não mais somados com os usuários do Mac OS como na coluna anterior) e de Windows (porcentagens expressas como frações decimais; ou seja, 0,8 corresponde a 80%, 0.9 a 90% e assim por diante) às quais foram acrescentadas as linhas de tendência (em pontilhado) obtidas dos dados por regressão linear e as equações correspondentes:
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Figura 1:
Porcentagem de usuários de SO de janeiro de 2002 a maio de 2006 |
Antes de prosseguir, uma observação para evitar mal-entendidos. Eu não sou um especialista em estatística, sou apenas um velho engenheiro cansado de guerra que tem alguma experiência no uso de planilhas eletrônicas. O que fiz não foi manipular dados em proveito próprio ou coisa parecida. Apenas recuperei os dados oferecidos pela W3 Schools, lancei-os em uma planilha Excel e usei os recursos da própria planilha para traçar os gráficos de variação das porcentagens, as linhas de tendência e para calcular suas equações. Mais nada, apenas isso.
Se você consultar os dados na fonte perceberá que enquanto as porcentagens correspondentes aos anos de 2002 e 2003 são arroladas bimestralmente, as correspondentes aos anos de 2004, 2005 e 2006 são mensais. Isto causa uma pequena distorção no início das curvas, mas considerei esta distorção desprezível e, portanto, aceitável. Se você discordar pode usar os mesmos dados, interpolar os valores correspondentes aos meses pares dos anos de 2002 e 2003 e refazer a regressão linear (só não o fiz por achar que o trabalho não compensaria). Acredito que obterá resultados extremamente semelhantes aos por mim obtidos mas, se não forem, por favor, remeta seus dados que com prazer os divulgarei. Da mesma forma, se alguém considerar que a tendência indica um crescimento exponencial (e não linear, como me pareceu) das porcentagens de usuários Linux e um decréscimo igualmente exponencial das porcentagens de usuários Windows, que faça as regressões baseadas neste pressuposto e remeta os dados que serão aceitos e divulgados com o mesmo prazer. Não tenho qualquer preconceito ou preferência por fonte de dados ou método de regressão, simplesmente trabalhei com os que dispunha.
Mas, sobretudo e acima de qualquer outra consideração: caso o resultado da análise estatística dos números disponíveis abaixo descrito lhe desagrade, tenha misericórdia e não brigue comigo. Brigue com os números. Afinal, foram eles que indicaram as tendências. Meu único papel neste imbróglio foi calculá-las.
E o que indica este cálculo?
Que, de fato, a soma das porcentagens dos usuários de todas as versões de Windows vem decrescendo continua e paulatinamente nos últimos anos e que a equação que quantifica este decréscimo é:
y = - 0,0012x + 0,9325
onde “y” representa a porcentagem (expressa sob a forma de número decimal) dos usuários Windows e “x” o número de meses decorridos desde a origem da coleta dos dados, janeiro de 2002.
Em contraposição, o cálculo da regressão linear dos dados relativos à porcentagem de usuários de Linux indica que ela vem crescendo paulatina e continuamente ao longo do mesmo período e que a equação que quantifica este crescimento é:
y = 0,0004x + 0,0225
Portanto, para gáudio dos briosos defensores da tribo Linux, fica claro que, se estas tendências não se alterarem, a porcentagem de usuários Linux igualará e, finalmente, ultrapassará a de usuários Windows. É só uma questão de tempo.
De quanto tempo?
Não é difícil calcular. Basta igualar os termos da direita de ambas as equações e calcular “x”, o número de meses que transcorrerão a partir de janeiro de 2002 até que a porcentagem de usuários Linux alcance a de usuários Windows.
Se não houve erro (e, se houve, solicito encarecidamente a um dos muitos leitores desta coluna cujos conhecimentos de estatística e matemática são superiores aos meus que efetue a correção que eu alegremente a publicarei com as devidas desculpas), o valor de “x” que iguala os valores de “y” é x = 569 meses, ou seja, 47 anos e cinco meses. Que, se contados a partir de janeiro de 2002, origem dos dados, levam a maio de 2049. Segundo a tendência apontada pelos números disponíveis, somente a partir de então a porcentagem de usuários Linux será maior que a de usuários Windows.
Pena que eu não estarei vivo até lá para comemorar com meus amigos da tribo Linux...
(De novo: aqui não vai nenhum juízo de valor, nenhuma opinião qualitativa, nenhuma crítica ou elogio a qualquer sistema operacional. Apenas uma análise de tendências efetuada por Excel sobre os números oferecidos por uma fonte confiável. Se o resultado não lhe apetece, não brigue comigo, brigue com os números).
4) E vamos, afinal, para o derradeiro argumento. Que pode ser resumido mais ou menos pela frase: “o fato da maioria usar Windows não quer dizer nada”.
Quem usa este tipo de argumento geralmente é um usuário Linux com um conhecimento de informática muito acima da média, que conhece detalhadamente diversas distribuições do sistema e que tem um conhecimento sobre Windows também acima da média, portanto uma pessoa altamente qualificada para avaliar qualidades e defeitos de sistemas operacionais. Uma pessoa que, feita a avaliação e depois de pesar todas as vantagens e desvantagens e considerar inclusive alguns fatores subjetivos, concluiu honestamente e com toda a boa fé que Linux é um sistema superior seja por suas qualidades, seja pelo fato de ser “livre”, seja porque não foi desenvolvido por uma multinacional e portanto não drena recursos do país, seja por uma combinação desses fatores. Todos, para ele, incontestavelmente verdadeiros. E, a partir desta conclusão, tomou para si a tarefa de evangelizar os demais usuários, cujo conhecimento de informática é muito inferior ao seu e que talvez por isso prefiram Windows, convencendo-os daquilo que lhe parece tão óbvio: Linux é um sistema superior a Windows. E passa a partir de então a ser um ferrenho defensor de Linux, engajando-se na “luta contra Windows”.
Ele faz isso porque está honestamente convencido de que Linux é de fato melhor, que seu julgamento se baseia em argumentos incontestáveis, razões sólidas derivadas de um profundo conhecimento técnico e imbuído de absoluta boa fé. E, por menos que acredite nisso, conta com toda a minha simpatia e compreensão.
O problema é que por mais cristalinos que lhe pareçam seus argumentos, por mais lógicas que sejam suas razões, por mais sólido que seja seu embasamento técnico, ele se frustra por não conseguir convencer à maioria das pessoas daquilo que lhe parece evidente: Linux é melhor e deve substituir Windows em suas (deles) máquinas. A maioria ignara continua preferindo Windows.
Sua primeira reação é de perplexidade. Como pode um sistema que além de ser tão evidentemente melhor e ainda por cima gratuito, ser suplantado por um outro que ele está honestamente convencido que é inferior? Como abrir os olhos dos que se negam a perceber esta verdade elementar? E ele se empenha cada vez mais em sua guerra santa.
Em seguida vem a indignação. Por que será que tão poucos enxergam o óbvio? Por que ninguém vê a luz? Por que artes do demônio, ou de Bill Gates (que, para alguns deles, representam a mesma entidade), ou de colunistas inescrupulosos, ou da imprensa especializada em geral, ou de uma improvável conjugação das forças do mal, a suprema verdade da superioridade de Linux não se evidencia? Indignado, ele começa a considerar como inimigos os que, por uma razão ou por outra preferem Windows e, máxima culpa, defendem seu uso (apenas para esclarecer: eu não me incluo entre aqueles que “defendem” o uso de Windows: acho que cada um deve usar o sistema operacional que melhor lhe aprouver e eu não tenho nada a ver com isso; apenas uso Windows porque para mim é mais conveniente, já que o conheço bem e é o sistema usado pela maioria de meus leitores; na coluna anterior me limitei a constatar que a porcentagem dos usuários de Windows é muito superior à de usuários de outros sistemas sem jamais sugerir que isto indique que Windows seja ou não superior a Linux ou que por isso fulano ou beltrano deva usá-lo; se o fato da maioria usar Windows ofende os defensores do Linux a culpa não é minha, é da maioria, que usa Windows).
Finalmente vem a revolta. Como seus argumentos racionais parecem ser ignorados ele apela para a emoção e começa a atacar os “inimigos”. Quase sempre de forma bastante agressiva. E começam a aparecer em seus iracundos comentários os adjetivos “lixo”, “preguiçoso”, “usuário torto”, “mundinho M$”, “idiotas” (todos estes colhidos nos comentários da coluna “Tendências”) e quejandos. Daí para frente perde-se qualquer base racional, a discussão vira briga e nada acrescenta exceto animosidade, mágoa, ressentimento e inimizade entre colegas do mesmo Fórum.
Mas, não obstante tudo isso, a maioria dos usuários continua usando “o outro” sistema operacional, o inferior, o “lixo”. A tendência não se reverte. O que fazer?
Bem, o que fazer eu não sei. Mas sei que enfrentei dilema similar há uma década e talvez minha experiência sirva pelo menos para ilustrar o assunto.
No início dos anos noventa do século passado, quando eu ainda escrevia no jornal O Globo, um belo dia cheguei à redação e encontrei uma pilha de mais de vinte disquetes esperando por um voluntário que os instalasse. Era uma versão beta do OS/2 2.0, o primeiro sistema operacional realmente “de 32 bits”, então desenvolvido pela IBM, que ninguém tinha se atrevido a encarar.
Levei aquele monte de disquetes para casa e instalei o sistema. Fiquei maravilhado. Tinha uma interface gráfica primorosa, era de uma estabilidade extraordinária, rodava todos os programas disponíveis na época, tanto os desenvolvidos para o DOS quanto os desenvolvidos para Windows além daqueles desenvolvidos para o próprio OS/2. Até hoje, com todos esses anos de estrada, jamais vi sistema operacional tão cheio de qualidades.
Na época seu concorrente era o Windows 3.x, que então era pouco mais que uma interface gráfica bem elaborada rodando sobre o DOS. Não passava, portanto, de um DOS revisto, recauchutado e ligeiramente enfeitado. Comparado com o OS/2 o Windows 3.x chegava a dar pena.
Estamos falando do início dos anos noventa, quando a Internet ainda não havia se popularizado e a troca de mensagens era feita pelos “BBS”. Um belo dia estava eu a rodar minha versão beta do OS/2 editando um texto enquanto baixava o “pacote” de mensagens de meu BBS quando, por alguma razão, o sistema travou. Afinal, era uma versão beta e isso ocorria de vez em quando. Levantei a mão para acionar o botão de “reset” e neste momento reparei que os indicadores luminosos de meu modem externo continuavam piscando. Mas como, se o sistema havia travado?
Esperei algum tempo até a inatividade do modem indicar que a transferência havia sido concluída, reinicializei a máquina e fui verificar. Sim, o pacote estava lá, íntegro. Mesmo com o travamento, o programa de transferência continuou rodando no modo protegido e o arquivo foi transferido sem perda de um único byte. O que havia travado fora apenas a interface gráfica (que se chamava “Workplace Shell”). O cerne (“kernel”) do sistema operacional continuara ativo, assim como todos os programas que estavam rodando naquele momento, inclusive o de acesso ao BBS.
Aquilo me convenceu que eu estava usando um SO muito especial. A partir de então me dediquei a aprender mais sobre o OS/2, seu funcionamento interno, sua estrutura, sua interface gráfica. E o que aprendi foi suficiente para me fazer perceber que eu estava diante de algo superior a tudo o que havia sido desenvolvido até então em matéria de sistema operacional para a linha PC.
Daí para a frente tornei-me um “evangelizador” do OS/2. Passei a freqüentar seus grupos de usuários e, na qualidade de membro desses grupos e colunista de informática, a receber informações diretamente da IBM sobre a evolução do sistema e das sucessivas versões a partir de seu lançamento em 1993. Despendi centenas, talvez milhares de horas de trabalho aprendendo a usar o sistema e cheguei a publicar um livro sobre ele (Piropo, B. “OS/2 2.0 – Guia básico da Workplace Shell”, Campus, 1993).
Escrevi dezenas, talvez centenas de colunas e artigos sobre o OS/2. Divulguei-o tanto quanto pude. Empenhei-me com afinco em sua disseminação. E tudo isso sem receber um único centavo da IBM, a desenvolvedora do sistema (os que me conhecem sabem que isso é verdade; no período em que me dediquei a escrever o livro a editora me consultou sobre um possível patrocínio da IBM e eu recusei já que, por uma questão de ética, qualquer patrocínio me obrigaria a abster-me de fazer eventuais críticas ao sistema e como nada é perfeito, havia detalhes que mereciam ser criticados e eu gostaria de poder externar minha opinião livremente; jamais obtive qualquer vantagem financeira ou pecuniária pelo fato de haver tentado disseminar o uso do OS/2; defendia-o por estar convencido que ele era realmente melhor sem pretender levar qualquer vantagem, exatamente da mesma forma como agem atualmente os defensores de Linux e do software livre, aos quais dedico profundo respeito também por isso).
Não obstante meus esforços, a plebe ignara continuou a usar Windows.
Pior: no início de 1995, em Atlanta, EUA, durante a COMDEX Spring, na época um dos eventos mundiais mais importantes no campo da informática, me surpreendi ao constatar que praticamente todos os desenvolvedores de software destacavam seus melhores programadores e concentravam seus esforços no desenvolvimento de programas que iriam rodar em Windows 95, um SO que ainda não havia sido lançado, desprezando inteiramente o OS/2, um SO robusto, estável, disponível já há dois anos. E, na época, eu não conseguia entender como isso era possível. Afinal, sendo o OS/2 tão superior, por que os desenvolvedores de software não percebiam esta verdade elementar?
Hoje, sei que todos percebiam. Sabiam disso. A diferença é que eles, já naquela época, haviam constatado que a tendência não era o crescimento do OS/2. Pelo contrário: a tendência era que a maioria, que usava Windows 3.x, migrasse para Windows 95 quando ele fosse lançado. O OS/2 estava fadado a desaparecer.
Por que os usuários fariam isso?
Não sei e provavelmente os desenvolvedores também não sabiam. Apenas constataram que a tendência era aquela e agiram de acordo.
E foi exatamente o que aconteceu.
Algum de vocês, hoje, tem alguma idéia do que foi o OS/2? Pois eu dediquei três anos de minha vida a aprender a usá-lo e a difundi-lo. Em vão.
A partir de então, parei de contestar tendências. Procuro constatar quais são e ajo de acordo com elas.
Resumindo: esta coluna não foi feita para defender Windows nem para atacar o Linux. Em nenhum momento me atrevi a afirmar que Windows é melhor, superior, mais estável, mais bonito ou “mais qualquer-coisa” que Linux. Em nenhum parágrafo desta coluna ou das anteriores ataquei Linux, seus usuários, defensores e evangelizadores (mesmo porque, acreditem, simpatizo com eles). Apenas constatei, baseado em números que me pareceram confiáveis (mas que estou disposto a trocar por outros que me forem oferecidos, desde que igualmente confiáveis) que a quantidade de usuários Windows é significativamente maior que a de usuários Linux e que, a ser mantida a tendência atual, este panorama não será modificado até maio de 2049.
Quem viver, verá.
Se isso desagrada à legião de usuários Linux, paciência. Não sou responsável pelas tendências, apenas as constato.
Então, vamos combinar o seguinte: eu continuarei a escrever colunas sobre Windows e seus programas, além de outros temas, não porque ele seja melhor que qualquer outro SO mas simplesmente pelo fato de que é o sistema operacional que eu uso há um par de décadas e por isso desenvolvi alguma experiência e adquiri algum conhecimento sobre ele. Abster-me-ei de escrever sobre outros sistemas não porque eles sejam piores que Windows mas por uma limitação minha: não os conheço e meus princípios me proíbem de escrever sobre coisas que ignoro. Àqueles que meus escritos sobre Windows agradarem, bom proveito. Que a leitura lhes seja profícua. Aos que não agradarem, paciência. A eles sempre restará o consolo de que a leitura não é obrigatória e certamente encontrarão em outros lugares textos de outros autores mais condizentes com seu gosto.
Mas, por favor, apontem sua ira para outro alvo e deixem este pobre colunista em paz com suas mal traçadas linhas.
E não se fala mais nisso...
(eu, pelo menos, não falarei).
B. Piropo