< Coluna em Fórum PCs >
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10/01/2005
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< A Guerra do DVD > |
Se você procurar o significado do acrônimo “DVD” provavelmente encontrará duas acepções, Digital Vídeo Disc (“disco de vídeo digital”) e Digital Versatile Disk (disco digital versátil”). Não se deixe enganar: o que vale é o primeiro. O DVD foi concebido para armazenar filmes (ou “vídeos”) digitalizados para serem reproduzidos em uma televisão ou computador. O segundo nasceu quando a indústria percebeu que, além de filmes, aquele disco poderia armazenar qualquer outra coisa, inclusive dados e programas, e se deu conta que manter o termo “vídeo” na sigla poderia reduzir o mercado levando os usuários a acreditar que o disquinho só prestava mesmo para vídeo. Então inventaram o “versátil” (tinha que ser um termo que começasse com “V”...) para dar um significado mais abrangente ao acrônimo. O que, é claro, acabou por não fazer diferença alguma: todo mundo chama o treco de “DVD” mesmo, sem dar a mínima bola para o significado das letras. Mas nisso tudo aí de cima há um fato que nos interessa: o DVD foi concebido para armazenar filmes e a capacidade de um DVD convencional, de 4,7 GB (Gigabytes), leva isso em conta. Mas que filmes poderiam armazenados em 4,7 GB? Ora, aqueles produzidos em 1997, época em que o DVD ingressou no mercado: duração de até 135 minutos (duas horas e um quarto) em um padrão de compressão não muito severo. E estava tudo indo muito bem (basta ver como é difícil hoje em dia encontrar um bom filme em fita cassete VHS, só se acha em DVD) até que, de repente, apareceu a tal HDTV (High Definition TeleVision, ou televisão de alta definição). Um padrão de digitalização de imagens que, devido ao aumento do tamanho da tela e da resolução da imagem (maior número de pontos luminosos, ou células de imagem – picture cells, pixels – na tela) precisa de um espaço de armazenamento cinco vezes maior para gravar um filme de mesma duração. E como uma evolução tecnológica sempre leva a outra, o aumento da definição da imagem na tela deflagrou a disputa por um novo padrão de DVD com capacidade de armazenar os filmes em alta definição. Um observador menos atento pode imaginar que o problema não há de ser assim tão complicado. Afinal, basta fabricar um disco com maior capacidade de armazenamento. Mas na verdade a coisa não é simples. Basta lembrar a evolução dos CDs para os DVDs. Um CD, que usa uma tecnologia ótica semelhante à do DVD para recuperar dados (logo falaremos sobre isso) pode armazenar 700 MB (Megabytes). O DVD convencional tem uma capacidade quase sete vezes maior. No entanto os discos são exatamente do mesmo tamanho ( 12 cm de diâmetro) e praticamente todo acionador (“drive”) de DVD também reproduz CDs. Isso chama-se “compatibilidade retroativa” (backward compatibility) e o consumidor adora, pois permite aproveitar o equipamento novo para reproduzir os discos antigos. Logo, é de se esperar que a evolução para a próxima geração do DVD obedeça à compatibilidade retroativa. Uma façanha respeitável levando em conta o aumento da capacidade necessário. Senão vejamos: tanto o DVD convencional quanto o CD contêm uma única trilha em espiral que começa junto ao centro do disco e se “desenrola” até próximo da borda. Essa trilha é formada por pequenas saliências ou ressaltos separados por trechos da superfície original, espelhada, da face refletora do disco. Enquanto o disco gira, um feixe de raio laser é projetado sobre a trilha. Quando este feixe encontra um pequeno trecho da superfície original, é refletido para uma célula fotoelétrica. Quando incide em uma saliência, ou ressalto, é desviado para longe da célula. Com isso, na medida que o disco gira e a trilha é varrida pelo laser, a célula fotoelétrica recebe um feixe de luz intermitente. Isso gera uma sucessão de pulsos de corrente elétrica (células fotoelétricas emitem corrente elétrica quando recebem luz), pulsos esses que são convertidos em bits, que por sua vez são agrupados oito a oito para formar os bytes que codificam os dados digitalizados. LASER é o acrônimo de “Light Amplification by Stimulated Emission of Radiation”, ou amplificação da luz por emissão estimulada de radiação, um dispositivo que gera um feixe de luz monocromática quando estimulado por uma fonte externa de radiação. A luz utilizada nos CDs e DVDs convencionais é de cor vermelha, cujo comprimento de onda mede 0,65 m (mícron, ou milésimo de milímetro). A trilha única espiralada de um CD dá “voltas” (ou espiras) sucessivas, cada uma distando 1,6 m da anterior. Sua largura é de aproximadamente 0,5 m e o comprimento mínimo dos ressaltos que a formam é de 0,83 m (a altura dos ressaltos é de 0,125 m; estamos falando de coisas muito, muito pequenas mesmo). Tudo isso para conter seus 700 MB de dados. Como fazer para aumentar a capacidade para os 4,7 GB do DVD convencional mantendo o mesmo diâmetro do disco? A resposta é óbvia: “espremendo” mais a trilha, ou seja, reduzindo a distância entre duas espiras sucessivas, e diminuindo o tamanho mínimo dos ressaltos. E assim foi feito: a trilha dos DVDs convencionais tem um espaçamento entre espiras de 0,74 m e o comprimento mínimo do ressalto foi reduzido para 0,4 m (além disso, a espessura da camada de plástico transparente que recobre a superfície refletora foi reduzida de 1,2mm nos CDs para 0,6mm nos DVDs para diminuir a resistência à passagem da luz). Então, como fazer para multiplicar novamente a capacidade por cinco? Ora, repetir a dose: “espremer” ainda mais a espiral e reduzir mais um bocadinho o comprimento mínimo do ressalto. Mas acontece que a tecnologia estava praticamente no seu limite: nos DVDs convencionais o comprimento mínimo do ressalto já é menor que o comprimento de onda do feixe de luz a ser por ele desviado. Não dá para diminuir mais. Então o que fazer? A resposta é simples (o que não é simples é a forma de implementá-la): como o fator limitante é o comprimento de onda da luz do feixe usado para varrer a trilha, a solução é reduzir esse comprimento de onda, ou seja, usar luz de outra cor. E, depois de um bocado de esforço, os técnicos conseguiram criar um processo confiável de armazenamento ótico que segue exatamente o mesmo princípio dos CDs e dos DVDs convencionais usando um feixe de laser azul (mais precisamente, violeta), cujo comprimento de onda é de apenas 0,405 m. E com isso conseguiram aproximar ainda mais as espiras da trilha e diminuir o comprimento mínimo do ressalto. O parágrafo acima pede uma correção. Nele, eu mencionei que os técnicos haviam conseguido “criar um processo confiável de armazenamento ótico usando laser azul”. Na verdade, conseguiram dois. E, nesse caso, não vale o provérbio “quod abundat non noscet” (o que abunda não prejudica). Prejudica sim, e muito. Não se espante, não há mistério nisso. Se houvesse apenas um processo ele imediatamente assumiria a condição de padrão “de fato”, todos adeririam a ele e não haveria discussão. Como há dois, foi declarada a guerra de padrões. Enquanto um grupo de grandes empresas se bate por um deles, outro grupo, não menos poderoso, defende o segundo. E a briga está feia... Os padrões que estão disputando o mercado da próxima geração de DVDs denominam-se Blu-ray DVD e High Definition DVD (ou HD-DVD). O primeiro está sendo desenvolvido e disseminado pela Blu-ray Disc Association (BDA), que reúne um grupo de empresas de informática e entretenimento do qual fazem parte Dell, Hitachi, HP, JVC, LG, Mitsubishi, Panasonic, Pioneer, Philips, Samsung, Sharp, Sony e TDK. O segundo tem como principais defensores Toshiba, NEC e Sanyo. Como se vê, é briga de cachorro grande. De acordo com o padrão Blu-ray, um disco de uma única camada de gravação tem uma capacidade de 25 GB, o suficiente para armazenar duas horas de filme em alta definição ou mais de treze horas de filme em definição convencional. Há ainda previsão para uma versão de dupla camada cuja capacidade de armazenamento alcança 50 Mb e, além do tipo ROM (apenas para leitura, que não pode ser gravado), prevê-se a fabricação dos tipos R (de “Recordable”, gravável, que admite gravação uma única vez) e RE (de Rewritable, regravável, que permite gravação e regravação). O padrão foi concebido para manter compatibilidade retroativa, permitindo a reprodução de CDs e DVDs convencionais no mesmo acionador. A taxa de transferência de dados esperada é de 36 MB/s (Megabytes por segundo), contra 11,08 MB/s dos DVDs convencionais. Maiores dados técnicos, assim como fotos dos protótipos de aparelhos Blu-ray DVD e sua mídia, podem ser encontradas em < www.blu-ray.com >, juntamente com a informação de que os dispositivos deverão estar disponíveis no mercado no final deste ano a um custo estimado entre US$ 1.700 a US$ 2.000. Os desenvolvedores do padrão HD-DVD também apelaram para o laser violeta, mas reduziram menos o tamanho do ressalto e o espaçamento entre espiras sucessivas. O resultado foi um disco mais barato, mais fácil de fabricar, porém de menor capacidade. Um disco HD-DVD de camada simples armazena apenas 15 GB de dados (esse “apenas”, é claro, só faz sentido se comparado com os 25 GB armazenados por um Blu-ray disc também de camada simples). E, evidentemente, também mantém compatibilidade com os padrões anteriores. A guerra está em pleno andamento. E se você se deixou iludir pelo número e peso dos defensores do Blu-ray, assim como por sua maior capacidade de armazenamento, e isso lhe leva a presumir que eles não terão dificuldade para se assenhorear do mercado, cuidado. Pois os defensores do HD-DVD contam com uma vantagem que pode vir a ser decisiva. Seguinte: a distância entre espiras e o tamanho do ressalto adotados pelo padrão Blu-ray são tão pequenos que os 0,6 mm de espessura da camada protetora acima da superfície refletora podem provocar desvios do raio laser violeta que tornam a leitura impossível. Por isso eles foram obrigados a reduzir a espessura da camada protetora para apenas 0,1mm, o que exigiu o emprego de um tipo de material transparente de maior dureza (para resistir a riscos) e portanto mais caro. Já o padrão HD-DVD manteve o mesmo tipo de plástico e a mesma espessura, o que além de tornar o processo de fabricação de discos mais barato, permite a adaptação da maquinaria existente, hoje usada para fabricar DVDs convencionais, para integrar a linha de fabricação de discos HD-DVD. Portanto, não se deixe enganar: a guerra ainda está longe de terminar. E até agora, como andam as batalhas? Bem, no início de dezembro último a Memory-Tech, conhecida fabricante de discos óticos, anunciou que lançará ainda neste ano de 2005 um disco misto, com duas camadas. A superior obedecerá ao padrão DVD convencional, armazenando seus 4,7 GB de dados. Já a inferior (no mesmo disco), obedecerá ao padrão HD-DVD e terá uma capacidade de 15 GB. Segundo um porta-voz da empresa (veja artigo da PCWorld.Com em Mas a turma do Blu-ray não deixou barato: no final de dezembro, a JVC anunciou que desenvolveu um protótipo de disco DVD com três camadas, a superior obedecendo ao padrão Blu-ray com capacidade de armazenamento de 25 GB e as duas inferiores obedecendo ao padrão DVD convencional, cuja capacidade somada atinge a 8,5 GB. A diferença é que eles ainda não têm previsão para lançamento no mercado Pois é isso. Dentro de pouco menos de um ano vão começar a pipocar no mercado os primeiros computadores equipados com acionadores de DVD de alta capacidade. Alguns Blu-ray, outros HD-DVD. Durante um par de anos espera-se que os dois convivam no mercado, em luta ferrenha e acirrada. Então, um deles dominará o mercado e o outro desaparecerá. Assim será porque sempre foi assim. Essa é a lei do mercado, e não se pode fugir dela. É esperar para ver quem vai ganhar. B. Piropo |