< Jornal Estado de Minas >
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09/12/2004
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< Bêbedo, não! > |
Escolha o nome: porre, bebedeira, pileque, rasca, trabuzana, o que preferir. Depois de uma dessas, quando o sujeito acorda na manhã seguinte, mal sabe seu próprio nome, que dirá o que fez de madrugada. Com imenso esforço reúne a pouca lucidez que consegue amealhar, procura abrir os olhos a duras penas, levanta-se com imenso sacrifício, sai da cama tropeçando nas próprias pernas e... faz o que? Aqui nessas bandas, não sei (ao menos desconheço as estatísticas). Mas, na Austrália, a prestadora de serviços de telefonia móvel Virgin Mobile fez uma pesquisa e chegou a um resultado no mínimo curioso. Contra apenas oito porcento dos que correm em busca do alívio fornecido pelos misericordiosos comprimidos contra ressaca, a pesquisa concluiu que a primeira providência da vasta maioria – 55% do total – é descobrir onde enfiou o telefone celular e consultar a lista das ligações efetuadas durante a carraspana. E não sem razão. A pesquisa revelou que 95% dos clientes da Virgin Mobile já fizeram ligações telefônicas completamente bêbados (ou “sob a influência”, como a empresa educadamente classifica o supracitado estado etílico). Que, destas, quase um terço (30%, para ser exato) teve como alvo a (ou o) “ex”, quase um quinto (19%) foram para as (ou os) atuais e mais de um terço (exatos 36%) foram para Deus e todo o mundo, incluindo os chefes. Esses números já são suficientemente sérios, mas a coisa não pára por aí. O negócio fica mesmo assustador é quando se computa a freqüência com que essas ligações são feitas. Segundo a mesma pesquisa, 54% dos clientes fazem de uma a três delas por noite, 35% ligam mais de uma vez por semana e 37% mais de uma vez por mês. E se você, como eu, acha que essas porcentagens beiram o inacreditável, verifique por si mesmo: visite o sítio da Virgin Mobile Austrália, em < http://www.virginmobile.com.au/ > e clique no atalho “Dialing Under the Influence” – ou vá direto para a página < http://www.virginmobile.com.au/dui/index.html > e consulte os resultados da pesquisa. Telefonemas de bêbedos (perdão, de “cidadãos sob a influência”...) durante a madrugada não são coisa nova. Eu mesmo tenho um amigo que sempre que se deixava, digamos, influenciar um pouco além da conta, ligava para seu chefe e descarregava tudo aquilo que o bom senso e a autocensura lhe proibiam de dizer durante o expediente, com os previsíveis resultados no dia seguinte. Resultados esses que encerraram precocemente uma promissora carreira de economiário. E olhe que isso ocorria na minha juventude, pouco depois da metade do século passado quando, para perpetrar a sinistra faina, meu amigo tinha de ter a sorte de encontrar um telefone público que estivesse funcionando, além de dispor da indispensável “ficha” metálica (na era pré-digital não havia cartões magnéticos e a inflação na casa dos trinta ou quarenta porcento ao mês impedia que qualquer coisa funcionasse com moedas – o que levou o economista Delfim Neto a declarar que a única peça monetária brasileira que mantinha o valor estável era a ficha telefônica). Hoje, com o progresso da tecnologia, para fazer uma desgraça dessas basta tirar o celular do bolso e premir uma ou duas teclas para ligar para qualquer número armazenado na memória. A pesquisa da Virgin Mobile não entrou em detalhes mas não é difícil concluir que a grande aflição do biriteiro não consiste exatamente em descobrir para quem ligou durante a xumberga, mas em saber o que foi dito durante o papo. Pois colóquios mantidos nestas condições freqüentemente levam, no dia seguinte, a constrangedoras visitas ao/à interlocutor/a para se desculpar. E o pior é que raramente se sabe bem de que. Ou, mais grave, no caso dos varões empilecados, no dia seguinte tais ligações podem resultar em desconfortáveis confrontos com o novo companheiro da ex-namorada exigindo desculpas por algo que ele sabe muito bem o que – embora o confrontado necessariamente não. Situação especialmente embaraçosa quando o bebum é peso pena e o ofendido faixa preta. Diante disso a Virgin Mobile australiana decidiu dar sua contribuição para a segurança e bem-estar de seus clientes pinguços. E a partir de quarta-feira passada implementou um serviço mui apropriadamente batizado de “dialing under the influence” (discando sob a influência) que impede – ou pelo menos coíbe – a realização de certos telefonemas por usuários empilecados. A coisa funciona assim: se o cavalheiro (ou dama, por que não?) está nos prolegômenos de uma noitada da qual suspeita existir probabilidade significativa de se deixar levar por alguma influência, simplesmente tecla “ 333” seguido do número do telefone para o qual deseja prevenir ligações durante a gandaia. A Virgin Mobile, então, se encarrega de impedir que o referido número seja chamado do telefone do borracho até as seis horas da manhã seguinte, quando é de se presumir que o indigitado bandalho ou já esteja sóbrio ou demasiadamente chumbado para sequer tentar a ligação. Tudo isto a um módico custo de vinte e cinco centavos de dólar australiano por número bloqueado – o que, tendo em vista as possíveis conseqüências do tresloucado gesto que impede, é uma das maiores pechinchas jamais logradas pela tecnologia. Com raro senso de oportunidade, o serviço foi lançado praticamente às vésperas das festas de final de ano, quando se espera que o número de ligações, ahn... sob a influência, aumente consideravelmente. Agora, na Austrália, tudo o que o bêbedo expectante precisa é lembrar, ainda em estado de relativa sobriedade, os números de telefone que a prudência aconselha bloquear diante de suas intenções para a noite que se aproxima. Se conseguir, na manhã seguinte terá, no mínimo, uma preocupação a menos. B. Piropo |