< Mulher de Hoje >
|
||
02/1995 |
< Linha Novecentos > |
Você já ouviu falar na “linha novecentos”? Pois trata-se de um nome genérico para designar os telefones cujo prefixo é 900 e que prestam serviços. Você liga, recebe as informações e paga por elas. Os custos, proporcionais à duração da consulta, são cobrados diretamente na conta telefônica. No Brasil, isso é uma coisa relativamente nova. Mas nos Estados Unidos usa-se linha 900 para quase tudo. E mesmo aqui entre nós, principalmente em São Paulo, já há diversos tipos de serviços via linha 900, desde os dedicados a contar piadas até os que fornecem informações importantes sobre produtos. Eu mesmo já visitei um destes centros de prestação de serviços. E vi coisas interessantíssimas como a confecção de mapas astrais por telefone. Além de um serviço onde senhoras com aspecto de sisudas donas de casa divertem crianças, imitando a voz dos herois de desenho animado da televisão. E garanto que a coisa, vista de lá, é muito mais divertida que pelo telefone. Se não pelo assunto, ao menos pelo inusitado da situação. Mas a linha 900 também serve para atividades menos esotéricas. Como por exemplo ajudar a resolver aquela questão especialmente complicada do trabalho escolar ou fornecer dados para a pesquisa que o professor encomendou há um mês, foi deixada para a última hora e precisa ser entregue amanhã. O que é feito por uma simpática e esforçada equipe de professores em uma sala juncada de enciclopédias, material de consulta e, principalmente, computadores ligados a drives CD-ROM que contém uma imensa quantidade de informações sobre tudo o que os professores de imaginação mais delirante podem perguntar a seus alunos. E a julgar pelo número de ligações, tem um monte de aluno tirando nota alta às custas da linha 900. Pois bem: se há uma tribo especialmente ávida de informações, essa tribo é a dos micreiros. Gente que comprou um micro para ajudar nas tarefas do trabalho e descobriu que, para transformar a nova máquina em uma ferramenta eficiente, precisa aprender como operá-la. E como as dúvidas ocorrem justamente na hora em que se está fazendo algo importante com a máquina e é impossível interromper a tarefa para consultar livros técnicos e manuais, um serviço via linha 900 para esclarecer esse tipo de dúvida por telefone vem a calhar. Pois, em São Paulo, esse serviço já existe. Chama-se Doutor Chipp e serve para responder perguntas de micreiros aflitos sobre suas máquinas maravilhosas e esclarecer dúvidas sobre programas, sistemas operacionais, configuração da máquina e coisas que tais. Pois foi justamente para conhecer o Dr. Chip que visitei o tal centro de prestação de serviços via linha 900. E, ao invés de encontrar um sisudo professor, como o nome leva a crer, deparei-me com uma jovem, alegre e interessada equipe de técnicos e especialistas em informática, entusiasmados pelo trabalho que fazem. Passei horas conversando com a turma. Segundo eles, o mais fácil é justamente resolver os problemas técnicos. O complicado é identificar a natureza da questão. Pois grande parte dos usuários que recorrem ao Dr. Chip são principiantes, e por isso mesmo têm uma compreensível dificuldade de encontrar os termos técnicos adequados para descrever a natureza do problema. Que variam desde as encrencas mais cabeludas até erros triviais de usuário inexperiente. Como o caso do moço que decidiu descobrir para que servia um determinado comando experimentando-o em seu micro. E descobriu, da maneira mais dolorosa, que o comando em questão servia para apagar arquivos. Da experiência, resultou a perda de tudo o que estava gravado no disco rígido do rapaz. Na visita, descobri que quem presta este tipo de serviço tem muita história para contar. Aparece de tudo. Desde o maluco que resolveu passar um trote pela linha 900 (e pagou pelo trote, naturalmente) até a trêfega senhorita que ligou para o Dr. Chip sem saber direito do que se tratava. “Vocês conversam sobre o que?”, perguntou a curiosa donzela. Resolvemos problemas com computadores, respondeu o rapaz que a atendeu. “Só sobre isso?”, retrucou a moça um tanto desapontada. Só, respondeu o rapaz. Ela gostaria de conversar sobre o que? “Sobre o que você quiser...” veio de lá a resposta sexy, com voz lânguida e convidativa. O moço, que era sério e estava ali para trabalhar, desconversou, desculpou-se e encerrou a ligação encabulado. E há também os deliciosos desdobramentos da natureza humana. Certa feita, Dr. Chip recebeu um telefonema de um senhor que pretendia comprar um computador e queria saber qual a melhor configuração. É claro que a pergunta era genérica demais, mas o pessoal estava ali para isso mesmo. O problema é que, quanto mais explicações eram dadas, mais perguntas eram feitas, e a coisa estava começando a ficar cara. E o senhor era avisado, já que a cada quinze minutos de consulta o usuário é informado do tempo da ligação para evitar que, por distração, gaste mais do que havia planejado. A cada aviso, o senhor respondia que estava ciente do tempo e esticava o papo cada vez mais. A páginas tantas, informado que sua ligação já se aproximava da primeira hora, o pobre acabou por desabafar: ele de fato queria comprar o micro, mas isso não era assim tão importante e muito menos urgente. Acontece que sua mulher estava sendo submetida a uma cirurgia delicada naquele exato momento. Ele estava sozinho, na sala de espera, e não agüentava a tensão. O que ele precisava mesmo era conversar com alguém. No final, entre mortos e feridos, salvaram-se todos: a senhora se restabeleceu, ele comprou seu micro e todos foram felizes para sempre...
B. Piropo |