< Mulher de Hoje >
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08/1994
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< Dando Uso ao Micro Velho > |
Vamos lá, responda depressa: qual a idade da sua geladeira? A minha tem dez anos. Minha mãe tem uma que, por alguma razão inexplicável, recusa-se a trocar por um modelo mais novo. Resultado: reforma, pinta e aquele monstrengo já deve ter mais de vinte anos. Meia caidinha, é verdade, mas continua lá, firme e forte. E microcomputador? Quantos você conhece com mais de cinco anos? Existem, mas são poucos. E é fácil explicar a diferença: por mais que a tecnologia das geladeiras tenha evoluído nessas últimas duas décadas, a geladeira antigona de D. Eulina continua fazendo basicamente a mesma coisa que uma nova. Produz gelo e conserva os alimentos do mesmo jeito. Já a evolução da tecnologia dos micros pessoais é tão vertiginosa que um micro de três ou quatro anos é uma máquina praticamente obsoleta. Por isso é comum trocar de micro como quem troca de automóvel, substituindo o antigo por um modelo mais novo. Mas acontece que há um mercado ativíssimo de carros usados. E de computadores? No Brasil, ainda se consegue vender o micro usado. Não é fácil, o preço não compensa, mas sempre se encontra quem compre. Já nos EUA a coisa é diferente: um micro de dois ou três anos não tem valor comercial algum. Ninguém compra. E como por lá a informática pessoal é muito mais disseminada, os micros novos são muito mais baratos e o poder aquisitivo da população é mais elevado, o número de pessoas que trocam micros por modelos mais novos é muito maior que no Brasil. Estima-se que dentro de cinco anos haverá por lá cerca de cinqüenta milhões de micros obsoletos. Que já não valem nada. Não é que uma máquina dessas não preste para mais nada. Ao contrário: a maioria está em perfeito funcionamento. Elas apenas não atendem aos requisitos dos programas e sistemas operacionais modernos, mas continuam em condições de prestar serviços de imensa utilidade. Imaginem uma escola de uma comunidade pobre. Ou um centro de treinamento e reabilitação de pessoas deficientes. Ou uma obra beneficente que precise de um micro para organizar a administração e cuidar da correspondência. Essas instituições não precisam de um micro de última geração: a máquina usada que foi substituída por um micro de topo da linha serve perfeitamente. Então por que não doar o micro velho para uma delas? Está claro que qualquer pessoa de bom senso preferiria isso a simplesmente jogar fora o micro velho. Mas onde e como encontrar uma instituição carente de recursos para doar a máquina? Procurar dá trabalho, e por comodismo a maioria daqueles micros sem valor vai é para o lixo mesmo. Pois bem: esse ano, em uma grande feira de informática nos EUA, um estande chamou minha atenção. Era da NCF, National Cristina Foundation, uma instituição sem fins lucrativos que se dedica exclusivamente a encaminhar computadores usados às instituições que deles estejam precisando. A história da NCF é instrutiva. Há alguns anos o Dr. Bruce McMahan doou um computador à escola de educação de deficientes onde estudava sua filha Cristina, que sofria de paralisia cerebral. O uso do micro foi tão decisivo para a educação de Cristina e seus colegas de classe que o Dr. McMahan e a Dra. Yvette Marrin resolveram colocar essa tecnologia à disposição de quem precisasse dela em escala mais ampla. E criaram a NCF. Assim, a doação de uma única máquina disparou uma iniciativa que hoje conta com a colaboração de milhares de pessoas nos EUA. A NCF, através de contato com agências do governo americano, organizações nacionais e grupos envolvidos com o treinamento e reabilitação de pessoas deficientes, mantém um cadastro de centenas de instituições às quais um computador usado pode ser de utilidade. Basta telefonar de qualquer ponto dos EUA para doar um computador. A ligação é gratuita e o número é fácil de lembrar: 1-800-CRISTINA. A NCF vai buscar a máquina na casa do doador, encaminha à quem dela possa fazer bom uso e, de quebra, ainda fornece um recibo que pode ser abatido do imposto de renda. E aceita doações não somente de computadores, como também de programas, periféricos, equipamentos de audio, vídeo e máquinas e mobiliário de escritório que possam ser usados em instituições de treinamento e reabilitação. E, evidentemente, nada cobra destas instituições pelo serviço. Eu sei que aqui no Brasil o número de máquinas usadas de pequeno ou nenhum valor comercial é bem menor que nos EUA. Mas, em contrapartida, o número de pessoas que delas necessitam é muito maior. Pois essas máquinas podem servir não apenas para a reabilitação de pessoas deficientes, mas também para a educação em geral e para auxiliar a administração de instituições beneficentes. Quem sabe, algum dia, uma iniciativa assim tão bonita não florescerá também entre nós?
B. Piropo |